Capítulo 3: Somente Cristo - Solus Christus

 




Texto Bíblico Base Semanal: Hebreus 7.20-28

20. E visto como não é sem prestar juramento (porque certamente aqueles, sem juramento, foram feitos sacerdotes,
21. Mas este com juramento por aquele que lhe disse: Jurou o Senhor, e não se arrependerá; Tu és sacerdote eternamente, Segundo a ordem de Melquisedeque,
22. De tanto melhor aliança Jesus foi feito fiador.
23. E, na verdade, aqueles foram feitos sacerdotes em grande número, porque pela morte foram impedidos de permanecer,
24. Mas este, porque permanece eternamente, tem um sacerdócio perpétuo.
25. Portanto, pode também salvar perfeitamente os que por ele se chegam a Deus, vivendo sempre para interceder por eles.
26. Porque nos convinha tal sumo sacerdote, santo, inocente, imaculado, separado dos pecadores, e feito mais sublime do que os céus;
27. Que não necessitasse, como os sumos sacerdotes, de oferecer cada dia sacrifícios, primeiramente por seus próprios pecados, e depois pelos do povo; porque isto fez ele, uma vez, oferecendo-se a si mesmo.
28. Porque a lei constitui sumos sacerdotes a homens fracos, mas a palavra do juramento, que veio depois da lei, constitui ao Filho, perfeito para sempre.

Momento Interação

Ao longo da história cristã, é comum encontrarmos várias modalidades de “Cristo mais alguma coisa”. O ensino bíblico é muito claro: nossa salvação depende inteiramente da obra de Cristo realizada em nosso lugar. Ele foi nosso substituto, recebeu uma morte que era nossa para que, por ele, tivéssemos vida em seu nome. Mas a natureza humana não se sente muito confortável em ter de depender de alguém, não é verdade? É por esse desejo humano de autonomia que a história cristã vem registrando a criatividade humana em acrescentar alguma coisa (algo feito pelo ser humano para que ele tenha uma participação “razoável” em sua própria salvação) à pessoa e obra de Cristo.

Introdução

Jesus Cristo é o ponto focal das Escrituras, o personagem principal. No Antigo Testamento Ele é o Messias prometido, o Redentor do mundo; em o Novo Testamento Ele é revelado como Jesus Cristo, o Salvador, Filho de Deus. A cruz representa o mais central de todos os pontos focalizados pela Bíblia, pois ela faz convergir para o mesmo local a inominável maldade humana e a incomparável bondade e amor de Deus e Sua salvação. O tema do amor de Deus, particularmente conforme visto na morte sacrifical de Cristo no Calvário e esta é a maior verdade do Universo - representa o ponto focal da Bíblia. Todas as grandes verdades bíblicas, portanto, deveriam ser estudadas a partir dessa perspectiva.
O nome aramaico Yeshua assimilado pela língua hebraica significa Salvação, é uma abreviação do nome de Josué Yehoshua (YHWH é Salvação) que significa Deus é a Salvação. Jesus em nosso idioma é a transliteração de Yeshua, um nome muito comum nos tempos do Novo Testamento que expressava a fé dos pais hebreus em um Salvador vindo da parte do Pai. Quando o anjo Gabriel visitou José lhe disse que chamasse seu filho de Jesus dizendo: "porque ele salvará o seu povo dos pecados deles".  Esse nome identificava o filho de Maria gerado do Espírito Santo (Mt 1:20) como Aquele em quem se cumpririam as profecias messiânicas e as promessas do Antigo Testamento.

Os três Evangelhos Sinópticos e o Evangelho de João estão repletos de testemunhos que confirmam que Jesus é o centro do Evangelho e Aquele em quem se cumpririam as promessas e profecias bíblicas. João Batista, o último profeta messiânico se identificou como o precursor do Messias prometido nas Escrituras, ver (Mt 3.1-12; Mc 1.2-8; Lc 3.1-18 e Jo 1.19:34). Quando Filipe encontrou seu irmão Natanael disse: "Achamos aquele de quem Moisés escreveu na lei, e a quem se referiram os profetas: Jesus, o Nazareno, Filho de José" (Jo 2.45). 

O Senhor Jesus, após sua ressurreição apareceu a dois discípulos a caminho de uma aldeia chamada Emaús que ficava a sessenta estádios de Jerusalém, cerca de dez quilômetros encaminhou a mente dos discípulos às Escrituras. "E, começando por Moisés, discorrendo por todos os Profetas, expunha-lhes o que a seu respeito constava em todas as Escrituras" (Lc 24:27). Pouco tempo depois, apareceu aos onze e novamente chamou a atenção deles para Ele como aquele de quem as Escrituras testificavam e lhes disse: "São estas as palavras que eu vos falei, estando ainda convosco: importava se cumprisse tudo o que de mim está escrito na lei de Moisés, nos Profetas e nos Salmos" (Lc 24.44).

A expressão lei de Moisés se refere a Torah, palavra hebraica que significa Instrução e se refere ao nosso Pentateuco, os cinco primeiros livros da Bíblia, Profetas significa os livros proféticos do Antigo Testamento conhecidos como os profetas maiores e profetas menores e os Salmos representa os livros poéticos do Antigo Testamento. Essas três grandes divisões das Escrituras hebraicas tem Jesus e Seu ministério em prol da salvação do homem como o centro de suas mensagens. Paulo explicou isso dizendo que o fim da lei é Cristo (Rm 10:4) mostrando que a Torah assim como as demais Escrituras apontam para Cristo. A palavra grega usada por Paulo traduzida por fim é telos que significa finalidade, objetivo. As Escrituras Sagradas apontam para Cristo como o personagem principal, o mais importante (Jo 5:39).

Sobre Jesus disse João que "Isaías viu a glória dele e falou a seu respeito" (Jo 12.41). Em Isaías 6.1-5 temos o relato de uma visão da glória de Deus e em Isaías 53 vemos o Deus na cruz.  Jesus era a esperança do povo de Deus no Antigo Testamento e sua segunda vinda é a bendita esperança da igreja (Tt 2.13). A primeira profecia messiânica encontra-se em Gênesis 3.15 onde um descendente da mulher esmagaria a cabeça da serpente trazendo a vitória ao povo de Deus. Durante gerações e gerações aguardou-se o prometido Messias e Ele veio e foi rejeitado.  "Veio para o que era seu, e os seus não o receberam. Mas, a todos quantos o receberam, deu-lhes o poder de serem feitos filhos de Deus, a saber, os que crêem no seu nome" (Jo 1.11-12). O texto diz que os que crêem e não os que creram, ou seja, o cristão deve crer até o fim. 

É muito importante reconhecer que Jesus é o centro das Escrituras do Antigo e Novo Testamento, mas de nada isso adiantará se Jesus não for o personagem central e principal de nossa vida. O conhecimento da verdade só nos trará benefício prático para a vida eterna se esse conhecimento se tornar um conhecimento prático e não simplesmente teórico onde Jesus passa a morar em nós. O Evangelho se acha centrado em Jesus e não numa prática religiosa. Em Jesus Cristo a religião faz sentido, em Jesus todas as doutrinas bíblicas se encontram e se fundem.

I. Cristo Jesus - A Excelência do seu Explendor

Os sábios das religiões morreram, mas Jesus morreu e ressuscitou vencendo a morte.  Os deuses das religiões são deuses inanimados, mas Jesus é o Deus eterno. "Ninguém jamais viu a Deus, o Deus unigênito, que está no seio do Pai, é quem o revelou" (Jo 1.18).  "Não que alguém tenha visto o Pai, salvo aquele que vem de Deus; esse o tem visto" (Jo 6.46). Em todas as teofanias era o Deus unigênito quem aparecia e ninguém via seu rosto, pois não viveria, pois segundo Cristo ninguém viu o Pai. "Apareceu o Senhor a Abrão e lhe disse: Darei à tua descendência essa terra. Ali edificou Abrão um altar à YHWH, que lhe aparecera" (Gn 12.7). "Quando atingiu Abrão a idade de noventa e nove anos, apareceu-lhe YHWH e disse-lhe: Eu Sou o Deus Todo-Poderoso; anda na minha presença e sê perfeito" (Gn 17.1). "Apareceu YHWH à Abrão nos carvalhais de Manre, quando ele estava assentado à entrada da tenda, no maior calor do dia" (Gn 18.1). "Apareci a Abraão, a Isaque e a Jacó como Deus Todo-Poderoso; mas pelo meu nome, YHWH, não lhes fui conhecido" (Ex 6.3). "Disse Deus a Moisés: Assim dirás aos filhos de Israel: Eu Sou me enviou a vós outros" (Ex 3.14).

Quando perguntado: Quem pois te fazer ser? (Jo 8.53) Respondeu-lhes Jesus: Em verdade, em verdade eu vos digo: Antes que Abraão existisse, Eu Sou. Então, pegaram em pedras para atirarem nele; mas Jesus se ocultou e saiu do templo (Jo 8.58-59). Se Cristo tivesse dito: "Eu tenho sido" como insinuam alguns, os judeus não teriam porque tentar apedrejá-lo. O grego hē zoē de (Ap 1.18) é o equivalente hebraico Eyeh 'asher' 'ehyeh, o Eu Sou o que Sou de (Ex 3.14). Isso explica a hostilidade dos judeus para com Cristo quando se declarou o Eu Sou (Jo 8.58-59). Se os judeus entendessem o contrário não tentariam apedrejá-lo.

Cristo disse à igreja de Tiatira: Matarei a teus filhos, e todas as igrejas conhecerão que eu sou aquele que sonda mentes e corações, e vos darei a cada um segundo suas obras (Ap 2.23; 22.12 = Is 40.10). "Cesse a malícia dos ímpios, mas estabelece o justo, pois sondas a mente e o coração, ó justo YHWH (Sl 7.9), ver também" (Jr 17.10 e Mt 16.27).

II. A Doutrina de Cristo na Reforma

Em 1517, indignado com a venda de indulgências realizada pelo dominicano João Tetzel, Lutero escreveu em documento com 95 pontos criticando a Igreja e o próprio papa, as indulgências e as falsas concepções do Evangelho ensinadas ao povo. Estas 95 teses teriam sido pregadas na porta de uma igreja a fim de que seus alunos lessem e se preparassem para um debate em classe. No entanto, alguns estudantes resolveram imprimi-las e lê-las para a população, espalhando assim, as censuras à Igreja Católica Apostólica Romana. Em 1520, o papa Leão X redigiu uma bula condenando Lutero e exigindo sua retratação. Lutero queimou a bula em público o que agravou a situação. Já em 1521, o imperador Carlos V convocou uma assembleia, chamada "Dieta de Worms", na qual o monge foi considerado herege.

Embora Martinho Lutero não tinha ainda uma compreensão mais ampla da doutrina de doutrina de Cristo vemos já uma introdução à Cristologia em suas teses.  Nessas noventa e cinco teses Martinho Lutero demonstrou que é Jesus o Salvador, Mediador e Intercessor e não o clero. A doutrina de Cristo na Reforma Protestante foi um golpe sobre a igreja em sua venda discriminada de indulgências onde comercializavam a salvação que Jesus oferece de graça. Nós protestantes não cremos e concordamos em tudo com o que Lutero escreveu em suas noventa e cinco teses, mas concordamos que a salvação é obtida unicamente pela graça mediante a fé.

Na Reforma Protestante declarou-se que Jesus é o único mediador entre Deus e os homens (1 Tm 2.5) o único intercessor e sacerdote (Hb 7.24; 1 Jo 2.1). As penitências, indulgências, relíquias, perdão papal, missas, conficionários e qualquer outro meio não garantia o perdão ao pecador, Jesus é o único caminho (Jo 14.6). Só um intercessor sem pecado poderia oferecer seus próprios méritos ao homem.  A igreja, os santos, os sacramentos e qualquer outra tentativa de salvação que descarte a Cristo ou pretenda completar seus méritos é vã no que se refere a salvação.

III. Jesus Cristo - Perfeito para Sempre

Jesus é perfeito! Isso significa que Jesus nunca pecou, nunca errou. Ele nunca transgrediu a Lei de Deus e jamais fez qualquer coisa que não revelasse a glória de Deus. Foi um perfeito exemplo de obediência (1 Jo 2.6). Então apesar de ter sido tentado Ele venceu todas as tentações e nEle não foi achado erro ou falha alguma (1 Pd 1.22). Jesus também foi tentado em tudo, mas nunca cedeu a qualquer tentação (Mt 4.1-10; Hb 4.15). Pela encarnação, o Verbo de Deus torna-se uma pessoa única em todo o universo, possuindo duas naturezas completas e perfeitas, a natureza divina que lhe é peculiar desde toda a eternidade, e a natureza humana, formada por um corpo humano. Estas duas naturezas permanecem unidas, porém sem mistura ou confusão, permanecendo para todo o sempre nesta forma. A isto chamamos de união hipostática. Jesus é o único ser do universo com essa dupla natureza que liga a humanidade à Deus. Essa natureza divino-humana chama-se em teologia natureza teantrópica.  Jesus, Sua natureza e obra é um mistério para a humanidade.

"Evidentemente, grande é o mistério da piedade: Aquele que foi manifestado na carne foi justificado em espírito, contemplado por anjos, pregado entre os gentios, crido no mundo, recebido na glória” (1 Tm 3.16). Este Jesus, que é a pessoa única, o Verbo encarnado, perfeito homem e perfeito Deus, é o Jesus bíblico e histórico do cristianismo, quem crê em outro Jesus que não este, não pode ser considerado cristão, a aceitação de falsos mestres e falsas doutrinas no seio da igreja não pode ser aceita em hipótese alguma porque compromete o Evangelho. Professamos que o Senhor Jesus era e é perfeitamente humano e perfeitamente divino. Ele não era meio homem nem meio deus; mas totalmente Homem e totalmente Deus.

Verdadeiro Homem e Verdadeiro Deus, o Senhor Jesus Cristo é igual ao Pai e semelhante a nós: sua divindade e humanidade não são aparentes; são reais, perfeitas e plenas. Por este motivo, a obediência, paixão e morte de Jesus Cristo têm valor infinito, sendo, desta forma, o único meio de propiciar a ira de Deus (a reação de Sua santidade diante do pecado) e adquirir a redenção final e definitiva de Seu povo. A obediência de Cristo era a própria justiça de Deus e o seu sangue, o sangue de Deus, daí valor infinito de seu trabalho.  Resumindo, Jesus não foi perfeito, é perfeito e viveu em perfeição também como homem para que pudesse resgatar o homem. Somos salvos pela obediência de Cristo e não pela nossa. 

Conclusão

Martinho Lutero não foi o único reformador, mas foi o meio mais expressivo pelo qual o Senhor balançou as estruturas da igreja medieval lutando por um retorno à Bíblia Sagrada. Sola Scriptura era seu lema e deve ser o nosso. Martinho Lutero não tinha toda a luz, mas viveu à luz de seus dias.  Em suas teses há alguns itens que nós protestantes mais recentes não concordamos como a doutrina do purgatório e outros. Mas lançou as bases para a Reforma Protestante. Martinho Lutero e outros reformadores entenderam que a crença da igreja de seus dias no que se refere a salvação estava errada. Havia mediadores humanos, intercessores mortos, indulgências, missas, confessionários, penitências, relíquias e toda forma de distorção da teologia da salvação presente nas Escrituras Sagradas.

A Bíblia deixa claro que Jesus é o único e perfeito Salvador, Mediador, Advogado e Substituto e que são seus méritos aplicados pela fé ao pecador arrependido que o colocam em harmonia com Deus e não os sacramentos da igreja. Jesus não é o mediador supremo entre Deus e os homens, é supremo e único (1 Tm 2.5; At 4.12).  Maria e os santos não podem interceder e aplicar seus méritos aos pecadores porque seus méritos não salvam nem a eles mesmos e todos precisam da mediação e intercessão de Jesus.  Somente Jesus pode nos ligar a Deus (Jo 14.6). Não há outro meio de salvação e nem outro caminho que conduz ao Pai, sem Cristo nada podemos fazer (Jo 15.5).

Os judeus buscaram a salvação praticando ou tentando praticar as obras da lei, os cristãos dos dias da Reforma Protestante buscavam a salvação nos rituais vazios e sem vida da igreja em seus dias. Com o advento da Reforma e o retorno à Palavra de Deus temos uma compreensão soteriológica mais profunda entendendo e aceitando que fora de Jesus não há salvador. A salvação é pela graça mediante a fé para boas obras (Ef 2.8-10). Note que as obras são a consequência da salvação e não a causa e que é a graça de Jesus que nos dá o poder para praticar as boas obras.


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