domingo, 9 de janeiro de 2022

A Comida de Jesus

 




Por Leonardo Pereira



João Batista, o precursor de Jesus, foi conhecido por sua alimentação estranha. Comia gafanhotos e mel silvestre (Mc 1.6). Mas seus hábitos alimentares não foram motivo de rejeição pelos outros. João foi rejeitado e até executado por causa da mensagem que pregava. Jesus, porém, foi rejeitado exatamente por causa da sua comida. Várias vezes, alguns dos judeus usaram questões sobre alimentação como motivo de questionamento ou até desculpas para rejeitar Jesus. Criticavam, especialmente, algumas práticas dos discípulos de Jesus. Quando os apóstolos pegaram espigas no campo para comerem no sábado, os fariseus aproveitaram a oportunidade para condená-los (Mc 2.23,24). Jesus tentou corrigir sua interpretação errada das Escrituras. Quando os apóstolos não lavaram as mãos conforme as tradições dos fariseus, estes apontaram o dedo de acusação (Mc 7.1-5). Em outra ocasião, o próprio Jesus foi alvo da mesma crítica (Lc 11.38). Às vezes, o problema não foi o que Jesus comia, nem como o fazia, mas com quem. Para os fariseus e escribas, que se orgulhavam da sua superioridade religiosa, comer com pecadores foi um ato detestável. Quando Jesus fez isso, eles tratavam como ato escandaloso (Mt 9.10-13).

Mas, no final das contas, a comida de Jesus que levou à sua rejeição foi outra. Todos os casos citados acima até ilustram a diferença entre o alimento de Jesus e o dos seus acusadores, mas foi numa parada em Samaria que Jesus definiu para seus apóstolos a diferença fundamental. Os apóstolos se preocupavam com a alimentação de Jesus, e ele respondeu: “Uma comida tenho para comer, que vós não conheceis”. Os apóstolos não entendiam, e até acharam que outra pessoa tivesse dado comida para Jesus durante a ausência deles. Ele percebeu a confusão deles e explicou: “A minha comida consiste em fazer a vontade daquele que me enviou e realizar a sua obra” (leia o relato desta conversa em João 4.31-34).

Comemos para ficar satisfeitos, para preencher uma necessidade física. Quando passamos muito tempo sem comer, sentimos mal-estar, ansiedade e fraqueza. É extremamente raro encontrar uma pessoa em qualquer lugar do mundo que passa um dia sequer sem pensar na comida. A comida foi a maneira perfeita para Jesus ensinar uma verdade essencial para qualquer um chegar à comunhão com Deus. A única coisa que satisfazia Jesus, que enchia a sua necessidade mais profunda, foi fazer a vontade do Pai e realizar sua missão em serviço a ele. Os judeus do Antigo Testamento cantavam sobre a única maneira de satisfazer esta mesma necessidade: “Como suspira a corça pelas correntes das águas, assim, por ti, ó Deus, suspira a minha alma. A minha alma tem sede de Deus, do Deus vivo; quando irei e me verei perante a face de Deus?” (Sl 42.1,2). Mas quando o próprio Filho de Deus andava no meio deles fazendo a vontade de Deus, eles não o aceitaram! Queriam moldar Jesus à imagem deles e sujeitá-lo às tradições religiosas inventadas por homens. Não conseguiam nem imaginar uma pessoa contente e satisfeita somente fazendo a vontade de Deus.

Jesus não somente se satisfazia com a vontade do Pai, ele chamou seus discípulos a serem preenchidos da mesma maneira. Uma parte da sua definição da essência do cidadão do reino de Deus vem nestas simples, mas profundas palavras: , “Bem-aventurados os que têm fome e sede de justiça, porque serão fartos” (Mt 5.6). Mas esta determinação de se satisfazer com a vontade do Pai e ensinar os outros a imitar seu exemplo levou à rejeição e abandono por parte das multidões que seguiam Jesus. O tema da pregação que causou forte revolta foi de se encher do caráter do Senhor, da sua própria natureza: “Eu sou o pão vivo que desceu do céu; se alguém dele comer, viverá eternamente; e o pão que eu darei pela vida do mundo é a minha carne” (Jo 6.51). Jesus não falava aqui de algum efeito mágico de comer o pão ou beber o cálice que representam seu sacrifício, como ele ordenou aos seus seguidores em outro momento (Mt 26.26-29). A verdade fundamental de João 6 que provocou uma reação forte dos ouvintes foi o desafio de achar nossa satisfação exclusivamente em fazer a vontade do Senhor!


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