sábado, 26 de março de 2022

Comentário Bíblico Mensal: Março/2022 - Capítulo 5 - Chamados a Viver Eticamente

 




Comentarista: Daniel Alcântara



Texto Bíblico Base Semanal: Salmos 103.1-13


1. Bendize, ó minha alma, ao SENHOR, e tudo o que há em mim bendiga o seu santo nome.

2. Bendize, ó minha alma, ao Senhor, e não te esqueças de nenhum de seus benefícios.

3. Ele é o que perdoa todas as tuas iniquidades, que sara todas as tuas enfermidades,

4. Que redime a tua vida da perdição; que te coroa de benignidade e de misericórdia,

5. Que farta a tua boca de bens, de sorte que a tua mocidade se renova como a da águia.

6. O Senhor faz justiça e juízo a todos os oprimidos.

7. Fez conhecidos os seus caminhos a Moisés, e os seus feitos aos filhos de Israel.

8. Misericordioso e piedoso é o Senhor; longânimo e grande em benignidade.

9. Não reprovará perpetuamente, nem para sempre reterá a sua ira.

10. Não nos tratou segundo os nossos pecados, nem nos recompensou segundo as nossas iniquidades.

11. Pois assim como o céu está elevado acima da terra, assim é grande a sua misericórdia para com os que o temem.

12. Assim como está longe o oriente do ocidente, assim afasta de nós as nossas transgressões.

13. Assim como um pai se compadece de seus filhos, assim o Senhor se compadece daqueles que o temem.



Momento Interação

Os princípios da ética cristã são extraídos das Escrituras Sagradas. A Bíblia é a infalível e inerrante Palavra de Deus, ou seja, o próprio Deus se revelou nas Escrituras. Por isso ela é totalmente inspira e possui autoridade plena para exortar, corrigir, ensinar e guiar o homem num modo de vida de acordo com a vontade do Senhor.  Em primeiro lugar, a ética cristã se fundamenta na realidade da existência de um único Deus. Esse único e verdadeiro Deus subsiste nas pessoas do Pai, do Filho e do Espírito Santo. Ele é santo e imutável, criador de todas as coisas. Ele criou o homem como um ser moralmente responsável, e lhe revelou o padrão moral que o agrada. Saiba mais sobre o que é a Trindade. 

Introdução

Dentre as características que nos identificam como seres humanos, destaca-se a necessidade de estarmos em sociedade, em grupos que se assemelham e diferenciam de modo a promover o enriquecimento das percepções de mundo e da existência. Essas relações possibilitam encontros e desencontros, semelhanças e diferenças, evidenciam a necessidade de desenvolvermos habilidades para esse coexistir, ou seja, um padrão comportamental, uma postura moral e ética. Enquanto a moral se vincula ao conjunto de normatizações e regras propostas por uma sociedade, dentro de uma cultura, e portanto situada em um recorte histórico, a ética diz respeito a como cada indivíduo, dentro de sua liberdade interior, decidirá pelo rumo de suas ações.

Um viver ético nos viabiliza uma coerência no existir. Aos olhos dos demais, o comportamento regido pela ética parece carecer de liberdade, mas isso é um grande engano, pois a liberdade sem a ética é falsa e parcial, na medida em que é danosa à liberdade dos outros. Como cristãos, somos chamados a viver a ética em tudo, principalmente nas pequenas coisas. A partir desses pequenos passos, seremos capazes de trilharmos longos caminhos. Não que atingiremos a perfeição, mas, se assim procedermos, seguiremos os passos do Senhor, e com cada gota de nossas ações, a água viva da bondade, da justiça, do bem poderá chegar a mais e mais pessoas, tão ressequidas bela brutalidade de nosso tempo.

I. Temor e Tremor Diante de Deus

O profeta Moisés alertou o povo dizendo: Não temais (Êx 20.20), porém, em Levítico ele reitera para que tivessem temor do Senhor: “Não te assenhorearás dele com rigor, mas do teu Deus terás temor” (Lv 25.43). Outro ponto intrigante é a recomendação do apóstolo Paulo: “De sorte que, meus amados, assim como sempre obedecestes, não só na minha presença, mas muito mais agora na minha ausência, assim também operai a vossa salvação com temor e tremor” (Fp 2.12). Para alguns, este é um caso de contradição. Outros tentam explicar a passagem como sendo uma contradição aparente, ou simplesmente nomeiam de paradoxo. Mas, o que a Bíblia tem a dizer? Seria somente um problema de semântica e etimologia?

Uma coisa é certa no alerta que Moisés fez ao povo de Israel: Deus não se relaciona com as suas criaturas através do medo “Não temais” (Êx 20.20). A relação que Deus sempre procurou estabelecer com as suas criaturas pauta-se pela confiança. Por que as criaturas de Deus devem confiar? Porque Deus é fiel e justo, atributos basilar para se estabelecer uma relação de confiança (1 Jo 1.9). Além de fiel, justo e imutável, Deus se relaciona com criaturas livres, pois onde o Espírito do Senhor está, aí há liberdade (2 Co 3.17). Nenhuma das criaturas de Deus deve temê-Lo, pois Deus ama indistintamente as suas criaturas, e o amor lança fora o medo “No amor não há temor, antes o perfeito amor lança fora o temor; porque o temor tem consigo a pena, e o que teme não é perfeito em amor” (1 Jo 4.18).

Ora, Deus é amor, e em Deus não há medo, receio, temor, antes o perfeito amor lança fora o temor. Deus é amor; e quem está em amor está em Deus, e Deus nele (1 Jo 4.16). Quem está em Deus é porque confia n’Ele (1 Jo 4.16). Qualquer que tem medo teme somente a pena, pois o medo não procede de Deus. O que procede de Deus é a confiança, pois ele é fiel, verdadeiro, justo, santo, imutável, amor, luz, etc. Deus não pode ser tentado com o mal, e a ninguém tenta (Tg 1.13), portanto, o medo não procede de Deus. Qualquer que tem medo é porque não é ‘perfeito’ em Deus, ou seja, não ‘conhece’ a Deus, não crê em Deus e não está em Deus, pois se confiasse entenderia que, tal Cristo é, são os que creem aqui neste mundo (1 Jo 4.15 -18).

II. O Relacionamento com Deus é Puro e Santo

Para ter um relacionamento com Deus você precisa crer em Jesus como seu salvador. Quando isso acontece, você tem acesso a Deus e pode aprofundar seu relacionamento com Ele lendo a Bíblia, orando e andando em Seus caminhos. Relacionamento é união. Ter um relacionamento com Deus significa ter união com Ele, partilhando sua vida com Ele. O relacionamento com Deus é um relacionamento de amor, proximidade e confiança. Como todo relacionamento, o relacionamento com Deus cresce com o tempo e com dedicação (Tg 4.8). À medida que você conhece mais de Deus e tem mais experiência com Ele, seu relacionamento se torna mais profundo e firme. Ninguém pode se aproximar de Deus se não for salvo, porque o pecado nos separa de Deus. Jesus veio para lhe salvar do pecado, lhe unindo novamente com Deus (Jo 14.6). Ele morreu em seu lugar, para pagar por seus pecados, e ressuscitou para lhe dar a vida eterna, junto de Deus! Para ser salvo e ter um relacionamento com Deus, você precisa se arrepender de seus pecados, decidindo que quer mudar de vida, e crer que Jesus é seu salvador, que pagou seus pecados. Não é difícil!

Quando você se converte, o Espírito Santo entra em seu coração e seu novo relacionamento com Deus começa (At 2.38). Agora você tem acesso direto a Deus, através de Jesus! Ele lhe ama e vai lhe ajudar a crescer em seu relacionamento com Ele. É muito difícil ter um relacionamento com uma pessoa que você não conhece! Na Bíblia você vai conhecer mais de Deus, quem Ele é, como Ele se relaciona com você e o que O agrada. A Bíblia é a palavra de Deus. Quando você lê a Bíblia, Deus fala com você (2 Tm 3.16,17). Se você quer ter um bom relacionamento com Deus, você precisa ouvir sua voz, que está na Bíblia! Outra parte muito importante de um relacionamento é conversar. Orar é conversar com Deus. Quando você ora, você convida Deus a fazer parte de sua vida e partilha seus pensamentos, suas emoções, preocupações, frustrações e alegrias com Ele (Fp 4.6,7). A oração lhe aproxima de Deus e ajuda a colocar Deus em primeiro lugar em sua vida. Quanto mais você ora, mais você cria intimidade com Deus e fortalece seu relacionamento.

Um relacionamento também é feito de convivência. Um relacionamento com Deus é prático. Quando você vive sua vida cotidiana tentando agradar a Deus, você descobre mais sobre Ele e se aproxima dele (Cl 1.10,11). Suas experiências de vida com Deus vão fortalecer seu relacionamento, porque você vai ver Deus em ação em sua vida. A vivência diária também lhe vai ajudar a ver as coisas como Deus as vê, ficando mais próximo dele.

III. O Relacionamento com Deus é para a Eternidade

Ter um relacionamento pessoal com Jesus começa no momento que percebemos nossa necessidade dEle, quando admitimos que somos pecadores, quando nos arrependemos de nosso pecado e pedimos a Ele que entre em nossos corações para ser a autoridade em nossas vidas. Deus, nosso Pai Celestial, sempre desejou estar perto de nós e ter um relacionamento conosco. Antes de Adão ter pecado no Jardim do Éden (Gn 3), ele e Eva conheciam a Deus de uma forma íntima e pessoal. Eles andavam com Deus no Jardim e falavam diretamente com Ele. O pecado do homem nos separou de Deus. Deus é perfeito e não pode viver no meio de pecado. Antes da morte de Jesus na cruz, as pessoas tinham que sacrificar animais quando pecavam, pois a Bíblia diz que o salário do pecado é a morte.

O que muitas pessoas não sabem, percebem ou se importam é que Jesus nos deu o presente mais maravilhoso – a oportunidade de passar a eternidade com Ele e o Deus Pai se acreditarmos, quer dizer, confiarmos, nEle. “porque o salário do pecado é a morte, mas o dom gratuito de Deus é a vida eterna em Cristo Jesus, nosso Senhor”(Rm 6.23). Deus enviou o Seu Filho para carregar o peso de nosso pecado, ser morto e ressuscitar, provando Sua vitória sobre o pecado e morte. “Agora, pois, já nenhuma condenação há para os que estão em Cristo Jesus” (Rm 8.1). Ao aceitarmos esse presente, nós nos tornamos aceitáveis aos olhos de Deus e podemos ter um relacionamento com Ele.

Devemos incluir Deus em nossas vidas diárias da mesma forma que faríamos com um outro membro da família, sendo que Ele é muito mais importante! Devemos orar a Ele, ler Sua palavra e meditar nos versículos da Bíblia, com a intenção de conhecê-lO melhor e poder fazer Sua vontade. Devemos orar por sabedoria, que é a qualidade mais importante que podemos possuir. Devemos levar nossos pedidos a Ele, pedindo no nome de Jesus. Jesus disse: “Não fostes vós que me escolhestes a mim; pelo contrário, eu vos escolhi a vós outros e vos designei para que vades e deis fruto, e o vosso fruto permaneça; a fim de que tudo quanto pedirdes ao Pai em meu nome, ele vo-lo conceda” (Jo 15.16). Jesus foi Quem nos amou tanto que deu Sua vida por nós, e Ele é o único que pôde construir uma ponte entre nós e Deus. Foi Deus quem enviou Jesus; Eles são um e os dois merecem nossa honra, adoração e louvor.

Conclusão

O Espírito Santo também é Deus. Ele é a “parte” que nos foi dada para ser o nosso Conselheiro. “Se me amais, guardareis os meus mandamentos. E eu rogarei ao Pai, e ele vos dará outro Consolador, a fim de que esteja para sempre convosco, o Espírito da verdade, que o mundo não pode receber, porque não no vê, nem o conhece; vós o conheceis, porque ele habita convosco e estará em vós” (Jo 14.15-17). Jesus disse isso antes de morrer, e depois de Sua morte o Espírito Santo se tornou disponível a todos que estavam realmente procurando a Ele. É Ele quem mora nos corações dos crentes e nunca vai embora. Ele nos aconselha, ensina as verdades e muda os nossos corações. Sem o divino Espírito Santo, não teríamos a habilidade de lutar contra o mal e tentações. Mas já que O possuímos, começamos a produzir o fruto que surge quando deixamos o Espírito nos controlar: “amor, alegria, paz, longanimidade, benignidade, bondade, fidelidade, mansidão, domínio próprio” (Gl 5.22,23).

Esse relacionamento pessoal com Jesus não é difícil de achar e não há nenhuma fórmula misteriosa para alcançá-lo. Quando nos tornamos filhos de Deus, recebemos o Espírito Santo e Ele começa o trabalho em nossos corações. Devemos orar sem cessar, ler a Bíblia e frequentar uma igreja que acredita na autoridade da Bíblia – todas essas coisas vão nos ajudar a crescer espiritualmente. Confiar que Deus vai nos ajudar diariamente e acreditar que Ele é quem nos sustenta é a forma de termos um relacionamento com Ele. Talvez não vamos ver as mudanças imediatamente, mas poderemos enxergá-las com o tempo, e todas as verdades se tornarão claras.

Sugestão de Leitura da Semana: BARBOSA, Maxwell. Andando como Ele Andou. São Paulo: Evangelho Avivado, 2019.


Comentário Bíblico Mensal: Março/2022 - Capítulo 4 - Ética Cristã e Redes Sociais

 




Comentarista: Daniel Alcântara



Texto Bíblico Base Semanal: 1ª Timóteo 1.8-19


6. A coroa dos velhos são os filhos dos filhos; e a glória dos filhos são seus pais.

7. Não convém ao tolo a fala excelente; quanto menos ao príncipe, o lábio mentiroso.

8. O presente é, aos olhos dos que o recebem, como pedra preciosa; para onde quer que se volte servirá de proveito.

9. Aquele que encobre a transgressão busca a amizade, mas o que revolve o assunto separa os maiores amigos.

10. A repreensão penetra mais profundamente no prudente do que cem açoites no tolo.

11. Na verdade o rebelde não busca senão o mal; afinal, um mensageiro cruel será enviado contra ele.

12. Encontre-se o homem com a ursa roubada dos filhos, mas não com o louco na sua estultícia.

13. Quanto àquele que paga o bem com o mal, não se apartará o mal da sua casa.

14. Como o soltar das águas é o início da contenda, assim, antes que sejas envolvido afasta-te da questão.

15. O que justifica o ímpio, e o que condena o justo, tanto um como o outro são abomináveis ao Senhor.

16. De que serviria o preço na mão do tolo para comprar sabedoria, visto que não tem entendimento?

17. Em todo o tempo ama o amigo e para a hora da angústia nasce o irmão.

18. O homem falto de entendimento compromete-se, ficando por fiador na presença do seu amigo.



Momento Interação

As redes sociais digitais são aplicações que operam através da internet e que tem como finalidade conectar pessoas e organizações. A internet teve origem no século passado e se desenvolveu muito a partir do início deste século. Então foram nos últimos quinze anos que as principais redes sociais se propagaram grandemente. Essa propagação ganhou ainda mais força com o crescimento das tecnologias mobile. Hoje a maior parte dos acessos à internet é proveniente de aparelhos portáteis como telefones, tablets e até relógios. As principais redes sociais da atualidade são: Facebook, Twitter, Instagram, Youtube e Linkedin. Também podem ser incluídas nesse grupo as aplicações de comunicação instantânea, como o Whastaap. 

Como um cristão deve usar suas redes sociais? Esta é a pergunta de muita gente. Na verdade este assunto deve ser discutido e ensinado nas comunidades cristãs. É cada vez mais comum perceber um despreparo de muitos cristãos no uso de suas redes sociais. Alguns se mostram incapacitados de se posicionarem nas redes sociais de acordo com as verdades fundamentais da fé cristã; enquanto outros simplesmente acabam por envergonhar a Igreja de Cristo e trazer prejuízos ao Evangelho através da internet.

Introdução

Com base em alguns princípios da Palavra de Deus, podemos destacar alguns pontos que devem ser observados pelos cristãos no uso de suas redes sociais. Em primeiro lugar, o cristão precisa saber que tudo o que ele faz deve ser feito para a glória de Deus, inclusive seu uso das redes sociais. Todos os cristãos deveriam refletir se Deus está sendo glorificado através de seu perfil e de suas interações nas redes sociais. Em segundo lugar, o cristão jamais deve deixar que as redes sociais prejudiquem seu relacionamento com Deus. O pastor John Piper diz algo interessante sobre isso. Ele fala que uma das maiores utilidades das redes sociais será provar no dia do juízo que a falta de oração não era por falta de tempo.

Em terceiro lugar, diretamente ligado ao ponto anterior está também a necessidade de controle no uso das redes sociais. Muita gente tem tido muitos prejuízos emocionais, profissionais e até espirituais por causa da falta de temperança no uso das redes sociais. Algumas pessoas não conseguem se desligar de suas redes sociais nem mesmo na hora do culto! Em quarto lugar, o cristão deve saber o compartilhar e o que não compartilhar. Sem dúvida as redes sociais apresentam uma ótima oportunidade para a evangelização através do compartilhamento do Evangelho. Mas também elas fornecem muitas facilidades para divulgar aquilo que afronta a Palavra de Deus.

I. Amizades Verdadeiras

Após o triunfo sobre os filisteus, Saul conservou Davi como membro de sua corte. A Bíblia relata que desde o início nasceu uma amizade profunda e fraternal entre Davi e Jônatas. O texto bíblico descreve essa amizade dizendo que “a alma de Jônatas se ligou com a de Davi” (1 Sm 18.1). O termo hebraico utilizado para expressar a ligação entre Jônatas e Davi é perfeitamente apropriado para se referir ao tipo de amizade íntegra que havia entre ambos; pois é o mesmo termo utilizado em Gênesis 44.30 para se referir ao amor paterno de Jacó para com Benjamim. Na sequência do texto, lemos que Jônatas despojou-se de sua capa, armadura, espada, arco e cinto (1 Sm 18.4). Essa informação é muito significativa, pois nos ajuda a entender o tipo de caráter que Jônatas tinha. Em 1 Samuel 13.22, lemos que Jônatas, juntamente com seu pai, se destacava entre o povo pelas armas que possuía. Já no capítulo 18, encontramos Jônatas justamente transferindo sua capa e suas armas a Davi.

Esse foi um gesto público de grande afeição e respeito por parte de Jônatas. Isso simbolizou não apenas sua lealdade, mas também seu provável reconhecimento inicial de que Davi era o escolhido de Deus para reinar sobre Israel. Jônatas era o sucessor natural ao trono, portanto, humanamente falando, uma amizade com Davi era completamente improvável. No entanto, o príncipe realmente mostrou seu caráter diferenciado, e sua percepção apurada com relação ao destino espiritual de Israel, ao contrário de seu pai. Jônatas de fato era uma pessoa leal e íntegra. Sua lealdade fez com ele se arriscasse em prol de seu amigo, quando entendeu que se pai realmente planejava matar Davi. Além disso, vemos que Jônatas também não era uma pessoa egoísta e soberba; mas possuía um caráter humilde que colocava seus próprios interesses em segundo plano.

Amizade entre Jônatas e Davi foi verdadeira não apenas porque através dela eles se apoiaram mutuamente; mas porque essa amizade os envolveu em um compromisso com Deus. Jônatas e Davi não permitiram, de forma alguma, que qualquer coisa ameaçasse a harmonia de sua amizade. Na verdade, a amizade entre ambos se mostrou ainda mais forte quando foi provada (1 Sm 20.30-34,41). A amizade deles perdurou até mesmo após a morte de Jônatas, quando o rei Davi lembrou-se da aliança que eles tinham feito, e usou de benevolência para com Mefibosete, filho de Jônatas (2 Sm 9.7-13).

Como bem escreveu o sábio rei Salomão, “as amizades multiplicam os amigos; mas, ao pobre, o seu próprio amigo o deixa” (Pv 19.4). Infelizmente é esse tipo de padrão de amizade que é tão comum em nossos dias, onde as pessoas se aproximam umas das outras apenas objetivando algum benefício próprio. No entanto, o mesmo Salomão também escreveu que “em todo tempo ama ao amigo, na angústia se faz o irmão” (Pv 17.17). Certamente esse provérbio resume muito bem o tipo de amizade forte, sincera e exemplar que havia entre Jônatas e Davi, e que obviamente deve servir de exemplo para todos nós.

II. Amizades na Igreja

Paulo, como sabemos, foi um apóstolo muito usado pelo Senhor no início da igreja. Na sua segunda viagem missionária, na companhia de Silas, chegou à cidade de Listra, e ali encontrou o jovem Timóteo, “dele davam bom testemunho os irmãos em Listra e Icônio” (At 16.1,2). Paulo, então, quis levar Timóteo consigo para a continuação da viagem. Apesar da diferença de idade, começava assim uma relação de intimidade, encorajamento e cuidado mútuo. Entre alguns termos que ele usa para se relacionar a Timóteo, estão “meu cooperador”, “meu filho amado e fiel no Senhor” e “irmão” (Rm 16.21, 1 Co 4.17, Fp 2.19, Cl 1.1). Além disso, Paulo mostra conhecimento e proximidade com a família de Timóteo (2 Tm 1:5). Em certo momento, pela necessidade do Senhor e da igreja na época, Timóteo foi enviado por Paulo para cuidar da igreja em Éfeso e, assim, ajudar a resolver seus problemas. Nesse tempo, havia pessoas que ensinavam outra doutrina e que se ocupavam com fábulas e genealogias sem fim, o que promovia discussões entre os irmãos. A missão de Timóteo era árdua: tratar com essas pessoas e trazer a Igreja em Éfeso de volta ao amor procedente de coração puro, à boa consciência e à fé sem hipocrisia (1 Tm 1.3-5). Todo esse cenário abalou a Timóteo (1 Tm 4.16), o que levou Paulo a escrever duas cartas com recomendações e encorajamento.

Nessas duas cartas, podemos ver o cuidado de Paulo. Vemos que esse cuidado não era meramente de um líder, mas de alguém que conhecia a situação e conhecia a necessidade de Timóteo. Paulo promoveu o cuidado de amigo íntimo, pois esteve junto com Timóteo em viagens, o que lhes concedeu experiência, aumentou a amizade e a intimidade. O versículo 23 do capítulo 5 de 1 Timóteo mostra bem isso: “Não continues a beber somente água; usa um pouco de vinho, por causa do teu estômago e das tuas frequentes enfermidades”. Paulo conhecia a Timóteo ao ponto de saber que vivia constantemente doente. Paulo ainda exorta-o sobre a sua mocidade, para não desprezá-la, mas para se tornar padrão dos fiéis (4.16). Na segunda epístola, podemos ver mais ainda do encorajamento de Paulo para com Timóteo. De fato, Paulo foi um grande amigo para Timóteo.

Podemos tirar dessa amizade algumas lições sobre a importância de termos amigos na igreja: Precisamos de amigos que tenham a mesma visão que nós, que tenham o mesmo objetivo, que vivam para o Reino e se envolvam com os serviços na igreja. LIÇÃO 1: amigos possuem mesma visão e objetivo na vida cristã. São esses amigos que nos encorajam nas dificuldades, quando estamos fracos e desanimados em prosseguir firmes na fé. LIÇÃO 2: amigos se encorajam nas dificuldades. Precisamos estar perto dos irmãos, são as situações pelas quais passamos juntos que nos tornam íntimos. Paulo e Timóteo, por exemplo, viajavam juntos, serviam juntos, cuidavam de igrejas juntos. LIÇÃO 3: amigos fazem coisas juntos (inclusive, servem a Deus juntos). “Procura vir ter comigo depressa” (2 Tm 4.9). Nosso coração deve ser o de sempre poder estar perto dos irmãos e poder cuidar pessoalmente. LIÇÃO 4: amigos tem o coração de cuidar pessoalmente um do outro. Mesmo com a distância, podemos cuidar daqueles a quem amamos e precisam de atenção. Paulo usou uma carta para falar com Timóteo, era a ferramenta que tinha na época. Hoje, nós temos meios que nos permitem comunicação mais rápida com os irmãos como as redes sociais, o telefone, o celular, SMS, que podemos usar debaixo da luz do Senhor e com moderação. Mas também podemos usar cartas, muitos irmãos tem o hábito de mandar cartas e os que recebem são muito encorajados. LIÇÃO 5: amigos mantém contato mesmo com a distância.

II. Amizades na Família

Um objetivo muito importante dentro do âmbito da educação familiar é o cultivo da amizade. Trata-se de levar os filhos a saber o que vem a ser a amizade e a distinguir os amigos autênticos dos falsos. Mas, além de idéias claras e de critérios corretos sobre este tema, os filhos devem ser também capazes de fazer amizade e de ser bons amigos. O cultivo da amizade está intimamente relacionado com dois objetivos ainda mais amplos: aprender a querer bem às outras pessoas e aprender a conviver. São duas capacidades que se desenvolvem de modo natural na família, na medida em que esta última é lugar de amor e escola das virtudes da convivência. A influência do ambiente familiar costuma ser decisiva para o desenvolvimento, primeiro do comportamento social e depois dos hábitos de amizade. É verdade que o ambiente extrafamiliar - os colegas de estudo, da rua, etc. - pesa cada vez mais, mas os pais e os irmãos continuam a ser os principais agentes de socialização da criança, principalmente nos primeiros anos de idade.

Deve-se frisar, por isso, o impacto que as primeiras experiências sociais vividas no lar têm para os filhos. Se essas experiências forem gratas, eles tenderão a repeti-las, desenvolvendo assim atitudes de abertura para com os outros e hábitos de convivência. Se, pelo contrário, forem desagradáveis, procurarão evitá-las. As experiências sociais positivas ajudam fortemente os filhos a ser ativos, extrovertidos, independentes e curiosos; as experiências sociais negativas levam-nos a ser passivos, dependentes, introvertidos e reservados. As crianças do primeiro caso estarão em condições de influenciar os outros - terão liderança - e de ser criativas; as crianças do segundo serão, provavelmente, mais influenciáveis e conformistas. De que depende que as experiências sociais vividas no lar fomentem ou não a atitude dos filhos para a convivência?

Um dos fatores é o caráter global do lar. Quando o ambiente da casa se caracteriza pela tensão e pelo atrito habituais, é muito provável que isso gere atitudes sociais negativas nos filhos. Pelo contrário, quando se respira um clima de compreensão entre os membros da família, os filhos desenvolverão atitudes positivas. Outro fator é o das condutas que os filhos observam em casa. Os pais e os irmãos mais velhos são modelos de conduta que os filhos pequenos observam e imitam continuamente. É bom, por exemplo, que possam observar comportamentos que denotam preocupação pelos outros, compreensão, ajuda, flexibilidade... Os filhos percebem igualmente se o pai e a mãe se relacionam entre si com a benevolência e o altruísmo próprios do amor e da amizade, se têm ou não amigos, se sabem encontrar tempo para a amizade, se são generosos, sinceros, respeitosos e leais com seus amigos.

Um terceiro fator é o valor que os pais dão ao fato de os filhos serem sociáveis e terem amigos. Muitos pais encaram o tema da amizade como algo secundário. Ignoram assim que, como disse Aristóteles, os amigos são o que há de mais importante na vida. Ignoram que as relações de amizade ajudam as pessoas a conhecer-se, corrigir-se e superar-se em todos os aspectos. Se os pais, por exemplo, não permitem que os seus filhos tragam para casa companheiros de diversão e amigos, estarão aplicando uma nota negativa à conduta social dos filhos. Para que as crianças pequenas se desenvolvam como pessoas sociáveis, é preciso animá-las a sê-lo e premiar os esforços que façam. Mas isso apenas não basta, apesar de já ser algo bom: é preciso ensiná-las também a comportar-se de um modo socialmente aceitável. Uma forma de estimular os filhos à abertura para os outros é convencê-los com fatos de que vale a pena. É bom que vejam, por exemplo, que os seus irmãos e companheiros de estudo se comportam melhor com eles quando são tratados com generosidade e pior quando são tratados de maneira agressiva.

Um quarto fator para ajudar os filhos a desenvolver atitudes de convivência e amizade é a participação na vida da família. Existem lares participativos e lares não-participativos. Nos primeiros, há muita comunicação pessoal entre pais e filhos e entre irmãos. Os pais explicam o motivo por que existem certas regras na família, os filhos são consultados antes que se adotem algumas decisões que os afetam diretamente, pais e filhos colaboram nas tarefas domésticas... Nesses lares, existe um clima de confiança e diálogo espontâneo e sincero, como é próprio da vida de família. As decisões dos pais não são caprichosas ou arbitrárias.

III. Jesus, o Verdadeiro Amigo

“Ninguém tem maior amor do que este: de dar alguém a própria vida em favor dos seus amigos. Vós sois meus amigos” (Jo 15.13,14a). Uma amizade na igreja só é completa se Cristo faz parte. Nós temos um amigo que, sendo perfeito, deu a própria vida por nós e levou sobre si nossos pecados, transgressões e iniquidades para que pudéssemos finalmente poder estar perto dele e não se envergonha de chamar-nos de irmãos (Hb 2.11). Não faz o menor sentido deixarmos Cristo de fora das nossas amizades. Por isso, devemos buscar em cada amizade, especialmente com aqueles que são nossos companheiros espirituais, orar um pelo outro, orar juntos e ter uma relação de intimidade com Cristo. O Senhor quer ser nosso amigo, ele nos chama de irmãos e quer fazer parte das nossas amizades. Definitivamente: não podemos deixá-lo de fora! 

Por isso, inclua Cristo nas suas amizades. Infelizmente, o que temos visto muito nas igrejas são amizades destrutivas entre os jovens. Por não ter o Senhor como amigo, muitos jovens na igreja usam as suas amizades com outros jovens que também são irmãos para, juntos, desfrutarem do mundo e se envolverem com o pecado. É uma situação, infelizmente, recorrente no meio cristão, irmãos indo juntos para o mundo e até parando de se reunir. À respeito disso, Paulo exorta Timóteo: “Foge, outrossim, das paixões da mocidade. Segue a justiça, a fé, o amor e a paz com os que, de coração puro, invocam o Senhor” (2 Tm 2.22). Há, sim, o perigo de estarmos andando com irmãos que não invocam o Senhor de coração puro. É necessário que tenhamos discernimento quanto a isso, principalmente quando jovens, para que não sejamos enganados e venhamos a nos envolver com as paixões da mocidade, com o mundo e com o pecado, nos afastando do Senhor Jesus, que é o nosso verdadeiro amigo. Amigos influenciam muito uns aos outros. Por isso, para não ser influenciado negativamente, fuja de amizades destrutivas que te levam para o mundo e te afastam de Deus.

Ter amizades na igreja nos garante um vínculo mais forte com a família da fé, à qual nós podemos sempre recorrer e contar nas nossas necessidades. No fim de tudo, podemos concluir que ter amizades na igreja é muito importante. Precisamos de companheiros espirituais que nos ajudam a combater o bom combate, que correm conosco a carreira que nos foi proposta. Além disso, precisamos de Cristo em nossos relacionamentos com os irmãos, pois ele é a luz (Jo 8.12). Por ser a luz, Ele nos vem mostrar quais relacionamentos vão trazer edificação ou não. Se andamos nele, mantemos comunhão uns com os outros e Ele tem espaço pra cuidar de nós por meio dos irmãos. Faça suas amizades andarem sob a luz. Em todo relacionamento, tenhamos Cristo como nosso amigo e nossa luz!

Conclusão

Muitos que se dizem cristãos postam e compartilham conteúdo imoral. Outros escrevem e usam um linguajar estranho aos seguidores de Cristo. Eles falam palavrões, discutem, amaldiçoam e compartilham conversas imorais. Mas eles se esquecem de que Deus pedirá conta de toda palavra frívola que sai dos lábios do homem e, neste contexto, dos teclados de computadores e smartphones (Mt 12.34-36; cf. Ef 4.29; 5.4). O cristão deve tomar cuidado para não expor sua privacidade e a privacidade de sua família nas redes sociais. Especialistas da área de segurança da informação advertem para os perigos de informar a estranhos aquilo que acontece na intimidade de seu círculo familiar.

O cristão deve ter sabedoria para saber se posicionar em determinadas situações nas redes sociais. Ele deve estar ciente que nas redes sociais ele está sujeito a críticas, provações e comentários desagradáveis. No contexto evangélico, por exemplo, há muitas discussões acerca de certos pontos teológicos. É triste ver a facilidade com que a ira toma conta de alguns cristãos que se digladiam uns com os outros. É comum encontrar crentes que leram apenas um pequeno artigo teológico, mas se acham doutores em teologia nas redes sociais. O objetivo dessas pessoas geralmente não é mostrar a verdade da Palavra de Deus, mas mostrar o quanto eles sabem mais do que os outros.

A ética cristã sempre estará pautada nas Escrituras e buscará nelas os princípios que norteiam a vida do homem em sociedade. Jesus diz que seus seguidores devem ser sal da terra e luz do mundo (Mt 5.13,14). O apóstolo Pedro escreve que o cristão foi escolhido para anunciar as grandezas daquele que chamou das trevas para sua maravilhosa luz (1 Pe 2.9). O mesmo apóstolo também indica que o cristão deve ser caracterizado por sua boa conduta (1 Pe 2.12). Portanto, o cristão deve usar suas redes sociais de acordo com os limites estabelecidos pela Palavra de Deus. Aqui também podemos recordar como o apóstolo Paulo corrigiu o argumento dos cristãos de Corinto que alegavam poder fazer tudo o que quisessem. Ele escreve: “Todas as coisas me são lícitas, mas nem todas as coisas convêm; todas as coisas me são permitidas, mas eu não me deixarei dominar por nenhuma delas” (1 Co 6.12).

Sugestão de Leitura da Semana: GONÇALVES, Matheus. Vida com o Senhor. São Paulo: Evangelho Avivado, 2019.


domingo, 20 de março de 2022

O Exemplo de Esdras (7:10)



Esdras foi um sacerdote e escriba da lei no período pós exílico. Ele preparou o seu coração e buscou a Lei do Senhor, para cumprir e ensinar em Israel os seus estatutos e juízos (Ed 7:10). Ele foi um grande exemplo em buscar ao Senhor para o contexto da época. Esdras fez a diferença em três áreas.

Buscou a Lei do Senhor

Primeiramente, Esdras preparou o seu coração para buscar a lei do Senhor. Por quais motivos ele fez isso? A princípio, por amor ao Senhor, porque na lei ensinava: "ame o Senhor, seu Deus, de todo o seu coração, de toda a sua alma e com toda a sua força" (Dt 6:5). Esdras tinha se dedicado a conhecer os caminhos do Senhor e os seus pensamentos por meio da palavra de Deus. E você querido leitor, tem procurado conhecer os caminhos do Senhor por meio da Bíblia? Jesus afirmou: “se alguém me ama, guardará a minha palavra” (Jo 14:23).

Praticou a palavra de Deus

Segundo, Esdras preparou o seu coração para colocar os ensinos da Lei em prática. Como sacerdote do Senhor, ele sabia os benefícios de praticar os ensinos da Lei e os juízos de Deus pela desobediência. Semelhantemente, não basta apenas termos o conhecimento da palavra de Deus e vivermos uma vida totalmente contrária a sua palavra. É importante compreendermos que Deus nos entregou a sua palavra para obedecermos, como disse o profeta Samuel: "eis que o obedecer é melhor que o sacrificar; e o atender melhor é do que a gordura de carneiros" (1Sm 15:22).

Ensinou a palavra de Deus

Terceiro, Esdras preparou o seu coração para ensinar em Israel os seus estatutos e juízos. Uma das responsabilidades na Antiga Aliança dos sacerdotes, era de ensinar a Lei do Senhor para o povo (Dt 33:10). Esdras liderou com Neemias um dos maiores avivamento da Antiga Aliança, o povo precisava de alguém capacitado para ensinar a palavra de Deus, Esdras foi a pessoa selecionada para expor os textos sagrados. O avivamento veio sobre Israel porque esse homem de Deus preparou o seu coração para buscar a Deus, praticar e ensinar a palavra de Deus. E nós como igreja do Senhor, será que temos seguido esse exemplo? Estamos colocando em prática a grande comissão? Ensinando as Escrituras para aqueles que necessitam de entendimento dela?

Conclusão

Esdras foi um grande homem de Deus, isso é um fato inegável. Ele continua sendo um exemplo para a igreja do Senhor. Esdras nos ensina três princípios importantes da vida cristã de como agradar a Deus: buscar conhecer mais o Senhor a cada dia, colocar em prática os ensinos da Bíblia Sagrada e compartilhar esses ensinos com as pessoas ao nosso redor.

 

Sidney Muniz


 

sábado, 19 de março de 2022

Comentário Bíblico Mensal: Março/2022 - Capítulo 3 - Ética Cristã e Vida Conjugal

 




Comentarista: Daniel Alcântara



Texto Bíblico Base Semanal: Efésios 5.22-33


22. Vós, mulheres, sujeitai-vos a vossos maridos, como ao Senhor;

23. Porque o marido é a cabeça da mulher, como também Cristo é a cabeça da igreja, sendo ele próprio o salvador do corpo.

24. De sorte que, assim como a igreja está sujeita a Cristo, assim também as mulheres sejam em tudo sujeitas a seus maridos.

25. Vós, maridos, amai vossas mulheres, como também Cristo amou a igreja, e a si mesmo se entregou por ela,

26. Para a santificar, purificando-a com a lavagem da água, pela palavra,

27. Para a apresentar a si mesmo igreja gloriosa, sem mácula, nem ruga, nem coisa semelhante, mas santa e irrepreensível.

28. Assim devem os maridos amar as suas próprias mulheres, como a seus próprios corpos. Quem ama a sua mulher, ama-se a si mesmo.

29. Porque nunca ninguém odiou a sua própria carne; antes a alimenta e sustenta, como também o Senhor à igreja;

30. Porque somos membros do seu corpo, da sua carne, e dos seus ossos.

31. Por isso deixará o homem seu pai e sua mãe, e se unirá a sua mulher; e serão dois numa carne.

32. Grande é este mistério; digo-o, porém, a respeito de Cristo e da igreja.

33. Assim também vós, cada um em particular, ame a sua própria mulher como a si mesmo, e a mulher reverencie o marido.


Momento Interação

Logo no primeiro livro da Bíblia, o relato da criação faz referência à distinção entre os dois sexos criados por Deus: macho e fêmea. Na sequência, o Pentateuco traz ainda várias regulamentações relacionadas ao sexo – seja no que diz respeito ao seu significado primário como a diferença estrutural entre os dois membros da raça humana (homem e mulher), seja no que diz respeito ao seu significado secundário que se refere aos atos sexuais. A sexualidade humana foi criada por Deus. Isso fica muito claro quando a Bíblia diz que Deus criou macho e fêmea (Gn 1.27). Portanto, a sexualidade faz parte da natureza humana. Diferentemente dos anjos que foram criados com um número definido, Deus criou toda a humanidade a partir de um primeiro casal que se reproduziu através do sexo (cf. Lc 20.34-36). Em nosso idioma, a palavra sexo é usada tanto para se referir ao conjunto de características biológicas que indicam o indivíduo como macho e fêmea, quanto para se referir à prática sexual. Embora a palavra sexo não apareça na Bíblia, isso não significa que a Bíblia ignora o assunto. Pelo contrário! A Bíblia fala sobre a sexualidade humana de forma franca e clara.

Introdução

Desde o tempo do Iluminismo, a ética religiosamente baseada teve uma má reputação entre muitos intelectuais do ocidente. Sigmund Freud poderia ser tomado como um porta-voz de muitos estudiosos e educadores na forma como ele via a ética judaico-cristã como irracional, produtora de culpa, e falsamente restritiva da liberdade natural. Juntamente com muitos outros, Freud queria uma abordagem mais racional” da ética. E se essa rejeição da ética religiosamente baseada tivesse tido um ponto central de conflito, poderia facilmente ser em rejeitar a ética judaico-cristã com respeito ao casamento e sexo, uma rejeição que veio à proeminência cultural com a “revolução sexual” de uma geração passada. É provavelmente menos comum que intelectuais seculares tenham explicitamente rejeitado padrões morais judaico-cristãos a respeito de assassinato, roubo ou mentira.

Mas agora essa rejeição da ética religiosamente baseada está sendo questionada a partir de uma direção que pode ser surpreendente para alguns: a pesquisa empírica nas ciências sociais. Vários estudos empíricos recentes em psicologia e sociologia têm mostrado que as pessoas geralmente experimentam um nível bem mais alto de bem-estar e felicidade se permanecem casados por toda a vida e mantêm relações sexuais dentro do casamento. Não há mais nenhuma razão para ver as regras tradicionais religiosas contra o divórcio e o sexo fora do casamento como imposições irracionais de um Deus arbitrário ou inexistente.

I. As Bênçãos do Casamento

Antes de olharmos para o trabalho dos cientistas sociais, seria bom revisar com maior precisão o que era realmente alegado por pensadores da moral judaico-cristã. A alegação não era somente que regras morais procedem de Deus. Era também que regras morais apropriadas tendem a contribuir para o bem do homem, pois estas regras estão arraigadas em ou correspondem à natureza e relacionamentos humanos. Isso era verdade, quer alguém estivesse falando sobre a ética do sexo, de dizer a verdade, de proteger a vida e a propriedade, ou qualquer outra coisa. Pelo menos desde o tempo de Kant, a filosofia tem geralmente separado as questões de dever (éticas deontológicas) das questões que contribuem para o bem humano (éticas teleológicas ou utilitárias). E esta tendência filosófica é frequentemente vista em discussões populares que separam os deveres religiosos da felicidade humana.

Mas na tradição bíblica não há uma separação entre consideração de deveres e consideração do que contribui para o bem-estar humano. Na própria Bíblia parece não haver tensões entre dizer que alguém deve seguir certa regra moral porque ela procede de Deus, e dizer que alguém deve seguir essa regra moral porque a mesma contribui para o bem humano. Por um lado, após ter recebido os Dez Mandamentos de Deus e dado ao povo, Moisés pôde usar a linguagem de dever para com Deus para explicar a importância de guardar as regras. “Deus veio para vos provar, e para que o seu temor esteja diante de vós, afim de que não pequeis” (Êx 20.20). Por outro lado, Moisés pôde usar também a linguagem moral que soa teológica, que conecta regras morais com o bem humano, quando explicou o porquê as pessoas deveriam seguir as regras morais. “Andareis em todo o caminho que vos manda o SENHOR vosso Deus, para que vivais e bem vos suceda, e prolongueis os dias na terra que haveis de possuir” (Dt 5.33). A separação moderna entre dever moral e considerações do bem humano está simplesmente ausente na perspectiva bíblica. Os dois estão perfeitamente unidos porque Deus é visto como a fonte de ambos.

II. A Ética Cristã no Casamento

Se por um lado a sexualidade tem sido desvirtuada na sociedade pós-moderna, por outro lado alguns cristãos insistem em tratar o assunto como tabu. Embora o tema possa trazer desconforto para alguns, a sexualidade humana não pode ser subestimada. No ato da criação Deus fez o homem e a mulher sexualmente diferentes: “macho e fêmea os criou” (Gn 1.27). Portanto, o sexo faz parte da constituição anatômica e fisiológica dos seres humanos. Homens e mulheres, por exemplo, possuem órgãos sexuais distintos que os diferenciam sexualmente. Sendo criação divina, o sexo não pode ser tratado como algo imoral ou indecente. As Escrituras ensinam que ao término da criação “viu Deus tudo quanto tinha feito, e eis que era muito bom” (Gn 1.31). Desse modo, o sexo não deve ser visto como algo pecaminoso, sujo ou proibido. Tudo o que Deus fez é bom. O pecado não está no sexo, mas na perversão de seu propósito.

Ao criar o homem e a mulher, Deus também criou a sexualidade: “E Deus os abençoou e Deus lhes disse: Frutificai, e multiplicai-vos, e enchei a terra...” (Gn 1.28). O relacionamento sexual foi uma dádiva divina concedida ao primeiro casal, bem como às gerações futuras: “deixará o varão o seu pai e a sua mãe e apegar-se-á à sua mulher, e serão ambos uma carne” (Gn 2.24). Sempre fez parte da criação original de Deus a união sexual entre o homem e a sua mulher, formando assim, ambos uma só carne. O livro poético de Cantares exalta a sexualidade e o amor entre o marido e a sua esposa (Ct 4.10-12). Portanto, não é correto “demonizar” o desejo e a satisfação sexual. Assim como o sexo, a sexualidade também não é má e nem pecaminosa. O pecado está na depravação sexual que contraria os princípios estabelecidos nas Escrituras Sagradas.

A finalidade primordial do ato sexual refere-se à procriação. Deus abençoou o primeiro casal e disse-lhes: “Frutificai e multiplicai-vos, e enchei a terra” (Gn 1.28). Tal como o Criador ordenara a procriação dos animais (Gn 1.22), também ordenou a reprodução do gênero humano. Neste ato. Deus concedeu ao ser humano os meios para se multiplicar, assegurando-Lhe a dádiva da fertilidade. Depois da queda no Éden (Gn 3.11,23), e a consequente corrupção geral (Gn 6.12,13), o Altíssimo enviou o dilúvio como juízo para eliminar o género humano (Gn 6.17), exceto Noé e sua família (Gn 7.1). Passado o dilúvio, Noé recebeu a mesma ordem recebida por Adão: “E abençoou Deus a Noé e a seus filhos e disse-lhes: frutificai, e multiplicai-vos, e enchei a terra” (Gn 9.1). A terra, que outrora fora despovoada, agora deveria ser repovoada por Noé a fim de dar continuidade aos desígnios divinos (Gn 3.15, cf. Rm 16.20).

As Escrituras ensinam que o casamento é digno de honra (Hb 13.4) e que a união conjugal deve ser respeitada por todos (Mt 19.6). O leito conjugal não pode ser maculado por ninguém. Quem o desonrar não escapará do juízo divino (Hb 13.4b). Aqui a desonra refere-se ao uso do corpo para práticas sexuais ilícitas com ênfase nos casos de relações extraconjugais (1Co 6.10). Inclui também as relações conjugais resultante de divórcios e de segundo casamentos antibíblicos (Mt 19.9). Embora, muitas vezes, os imorais escapem da reprovação humana, não poderão fugir da ira divina (Na 1.3). A práxis da sociedade e a condescendência de muitas igrejas não invalidam a Palavra de Deus.

III. Zelando Eticamente pelo Casamento

Certa vez perguntaram a Jesus se era permitido o homem abandonar a mulher (cf. Mt 10.2-16). A pergunta era capciosa. Se Jesus falasse que sim, seria acusado de não ter misericórdia. Na sociedade patriarcal em que se vivia então, a mulher não tinha cidadania, era propriedade do marido. Se Jesus dissesse que não, estaria indo contra a Lei de Moisés que permitia ao homem dar carta de divórcio, quando não queria mais a mulher por qualquer motivo. E agora? Jesus respondeu com uma pergunta: o que diz as Escrituras? Jesus remonta à criação conforme está no primeiro livro da Bíblia. Qual foi o projeto original de Deus para a união entre homem e a mulher? Está no livro do Gênesis logo no início: Deus criou o homem e a mulher e os destinou um ao outro, para que vivessem no amor.

Jesus afirma que o homem e a mulher têm a mesma dignidade, os mesmos direitos. O amor verdadeiro não é por uma temporada. Quando existe mesmo é para sempre. Quando se ama, se cuida. Não estamos falando de paixão. Esta compara-se a um incêndio, o qual, quando acaba, deixa somente cinzas, a paixão quer devorar o outro. Amor brota da alma e se alimenta também do sacrifício de um pelo outro. Os fariseus que interrogavam Jesus se preocupavam se estavam dentro da Lei ou não (legalismo). A lei dava o domínio do homem sobre a mulher. Jesus, no entanto, propõe outra atitude: a preocupação com o relacionamento com Deus e com a outra pessoa. Deus, vida e ser humano vem antes da Lei. No relacionamento humano deve haver responsabilidade. Você é responsável pelo outro, é a ética cristã do matrimônio.

Moisés permitiu ao homem dar carta de divórcio para a mulher, a fim de amenizar sua situação em uma sociedade machista onde sem o marido a mulher teria que mendigar ou se prostituir para sobreviver. Era o mal menor, já que não se suportava o projeto original de Deus, que consiste na união de um homem e uma mulher que deixam sua família para formar outra família, fundamentando seu amor na unidade e fidelidade. No início desta pandemia vimos como aumentaram o número de separações. O susto de ter que conviver com o outro no dia a dia, na mesma casa, trouxe surpresas. Realmente, de perto ninguém é normal como se diz. Costumamos idealizar muito as pessoas e quando se trata do matrimônio, o romantismo estraga tudo, pois, não raro vive de fantasia.

Romantismo é a maneira de olhar o outro somente pelos sentimentos que acabam caindo no sentimentalismo. Ele ou ela não é príncipe ou princesa encantados. São seres humanos com seu lado luminoso e suas sombras. O romantismo vê somente o lado luminoso, vive de ilusão. A imaturidade impede muitas pessoas de assumir o matrimônio cristão com seu componente de diálogo, doação mútua, perdão, escuta e indissolubilidade. Feliz é o casamento no qual o homem é a cabeça e a mulher o coração, os dois, bem sincronizados pelo amor que leva à amizade. O casamento sem amizade é um dia sem aurora e o tempo está sempre nublado.

Conclusão

Alguém poderia adicionar que em tais casamentos de conflitos pequenos, o divórcio não parece ser de forma alguma sábio, dado os desgastes humanos, e tais casamentos poderiam prontamente ser reconciliados se existir o desejo de assim fazê-lo. Algum movimento em direção a esse “ideal transcultural” é possível. Passos práticos e úteis podem ser tomados. “Comprometimento  matrimonial, mostram estudos, é sustentado não somente por atração, mas também por uma convicção moral da importância do casamento e por temor dos custos sociais e financeiros de uma quebra de relacionamento”. Essa convicção moral e temor dos custos da quebra  matrimonial podem ser elevados nos jovens por uma nova geração de livros-texto para escolas e universidades, livros que possam identificar esses fatos científicos mais claramente que aqueles do passado, enquanto também sendo orientados para o bem humano. 

Atitudes e ações podem ser significantemente mudadas por leis e regulamentos a respeito de casamento e divórcio, e talvez até mesmo por regras financeiras e de impostos. Aulas bem definidas de preparação para casamento podem ser extremamente eficazes em dar aos casais a idéia, motivação, e habilidades práticas necessárias para fazer com que um casamento realmente dê certo. As ciências sociais nos dizem que casamentos que duram até o fim da vida (e a rejeição de sexo fora do casamento) é um fator muito grande na felicidade de indivíduos e para o bem da sociedade como um todo. A ciência pode também nos dizer que existem algumas coisas que podemos fazer para chegarmos mais perto desse ideal.

Sobre a base da ciência real, alguém pode afirmar agora a regra moral judaico-cristã, “não adulterarás”, como era tradicionalmente interpretada: você não pode acabar um casamento ou noivado com sexo fora do casamento. Mesmo um ateu pode afirmar que essa regra tem sido cientificamente mostrada como sendo crucial para o bem-estar humano. A rejeição dessa regra é agora não somente anti-religiosa, mas também anticientífica. Historicamente, os cristãos têm afirmado que essa regra foi encravada por Deus tanto na natureza e relacionamentos humanos, como também proclamada por Ele na consciência e nos Dez Mandamentos. A ciência pode não ser capaz de provar que essa regra vem de Deus, mas hoje o salto da ciência para a fé é bem menor do que pensávamos no passado.

Sugestão de Leitura da Semana: SANTOS, Matheus. O Viver do Cristão. São Paulo: Evangelho Avivado, 2019.


sábado, 12 de março de 2022

Comentário Bíblico Mensal: Março/2022 - Capítulo 2 - Ética Cristã e Ideologia de Gênero

 




Comentarista: Daniel Alcântara



Texto Bíblico Base Semanal: Romanos 1.21-32


21. Porquanto, tendo conhecido a Deus, não o glorificaram como Deus, nem lhe deram graças, antes em seus discursos se desvaneceram, e o seu coração insensato se obscureceu.

22. Dizendo-se sábios, tornaram-se loucos.

23. E mudaram a glória do Deus incorruptível em semelhança da imagem de homem corruptível, e de aves, e de quadrúpedes, e de répteis.

24. Por isso também Deus os entregou às concupiscências de seus corações, à imundícia, para desonrarem seus corpos entre si;

25. Pois mudaram a verdade de Deus em mentira, e honraram e serviram mais a criatura do que o Criador, que é bendito eternamente. Amém.

26. Por isso Deus os abandonou às paixões infames. Porque até as suas mulheres mudaram o uso natural, no contrário à natureza.

27. E, semelhantemente, também os homens, deixando o uso natural da mulher, se inflamaram em sua sensualidade uns para com os outros, homens com homens, cometendo torpeza e recebendo em si mesmos a recompensa que convinha ao seu erro.

28. E, como eles não se importaram de ter conhecimento de Deus, assim Deus os entregou a um sentimento perverso, para fazerem coisas que não convêm;

29. Estando cheios de toda a iniquidade, fornicação, malícia, avareza, maldade; cheios de inveja, homicídio, contenda, engano, malignidade;

30. Sendo murmuradores, detratores, aborrecedores de Deus, injuriadores, soberbos, presunçosos, inventores de males, desobedientes aos pais e às mães;

31. Néscios, infiéis nos contratos, sem afeição natural, irreconciliáveis, sem misericórdia;

32. Os quais, conhecendo o juízo de Deus (que são dignos de morte os que tais coisas praticam), não somente as fazem, mas também consentem aos que as fazem.


Momento Interação

A ideologia de gênero fixa suas raízes em vários sistemas ideológicos, pois se aproveita de resquícios de movimentos e revoluções que se deram ao longo dos séculos. Um dos principais, sem dúvida, é o Marxismo, com seu conceito de impossibilidade de conciliação entre as classes. Consequentemente, o Feminismo, amplamente influenciado pelo Marxismo, também aparece como fonte da ideologia de gênero. Basicamente a ideologia de gênero é a designação dada a uma corrente de ideias que defende a dissociação e distinção entre gênero e sexo, e afirma que o ser humano nasce com o gênero neutro. Este tema tem ganhado destaque nos últimos anos e vem obtendo apoio de parte da sociedade, da mídia e de vários governantes. Mas muitos cristãos ainda não sabem exatamente o que é a ideologia de gênero. Infelizmente alguns parecem não estar nem mesmo convencidos de que ética cristã e ideologia de gênero são coisas completamente opostas. Consequentemente, eles também não sabem se posicionar diante da ideologia de gênero de acordo com a Bíblia

Introdução

Teorias sociais, que nascem em laboratórios de ciências sociais das principais universidades do mundo, ensinam que as diferenças entre os sexos são resultados da relação histórica de opressão e preconceito entre homem e mulher. A este entendimento dá-se o nome de “ideologia de gênero”. Os defensores deste conceito promovem a inversão dos valores e afrontam os princípios cristãos. Apesar de cada época apresentar desafios diferentes à fé cristã, as Escrituras advertem aos cristãos o viver em santidade em todas as épocas e culturas (1 Pe 1.15,23-25). Muitos em nome da diversidade ou do direito à opinião solapam a ideia de verdade objetiva das coisas. A estratégia é dar ênfase a um fato que não se pode negar, mas ignorar a obviedade de tantos outros. Por exemplo, quem pode negar a diversidade cultural? Quem pode negar o direito à opinião? Entretanto, também é verdade que existem culturas que degradam o ser humano, bem como opiniões que são desqualificadas e completamente absurdas. Outrossim, a história mostra que pessoas que pautaram-se pela Palavra de Deus tiveram valores éticos-espirituais muito claros.

I. O que é Ideologia de Gênero

A palavra “gênero” tem origem no grego genos e significa “raça”. Na concepção da Lógica, o termo indica “espécie”. Usualmente deveria indicar o “masculino” e o “feminino”, como ocorre na Gramática. Nesse sentido, a expressão é inofensiva; porém, na sociedade pós-moderna tal significado é relativizado e distorcido em “ideologia de gênero”. Essa ideologia também é conhecida como “ausência de sexo”. Esse conceito ignora a natureza e os fatos biológicos, alegando que o ser humano nasce sexualmente neutro. Os ideólogos afirmam que os gêneros — masculino e feminino—são construções histórico-culturais impostas pela sociedade. Nos escritos marxistas a ideologia deixa de ser apenas “o conhecimento das ideias” e passa a ser um “instrumento” que assegura o domínio de uma classe sobre outra. 

O marxismo exerceu forte influência no feminismo, especialmente o livro “A Origem da família, a propriedade privada e o Estado” (1884), onde a família patriarcal é tratada como sistema opressor do homem para com a mulher. Desse modo a ideia central do conceito de gênero nasceu com a feminista e marxista Simone de Beauvoir autora da obra “O Segundo Sexo” (1949), onde é afirmado que “não se nasce mulher, torna-se mulher”. Assim, do contexto social marxista, que deu origem à “luta de classes”, surgiu a ideologia culturalista como sendo “luta de gêneros”, ou seja, uma fantasiosa “luta de classes entre homens e mulheres”. Nesse aspecto, a Ideologia de Gênero pretende desconstruir os papéis masculinos e femininos na sociedade atual.

A ideologia de gênero propaga que os papéis dos homens e das mulheres foram socialmente construídos e que tais padrões devem ser desconstruídos. Essa posição não aceita o sexo biológico (macho e fêmea) como fator determinante para a definição dos papéis sociais do homem e da mulher. Entretanto, as Escrituras Sagradas ensinam com clareza a distinção natural dos sexos (Gn 2.15-25; Pv 31.10-31). Outra consequência lógica dessa ideologia é que a determinação do sexo de uma pessoa agora é definida pelo fator psicológico, bastando ao homem, ou à mulher, aceitarem-se noutro papel. Além disso, faz-se apologia à prática do homossexualismo e do lesbianismo. Tanto as Escrituras quanto a tradição eclesiástica sempre confrontaram essa tendência humana de inverter os papéis naturais (Rm 1.25-32; Ef 5.22-33).

II. A Palavra de Deus e os Valores Absolutos

Num mundo onde parece que o único princípio que conta são os nossos valores pessoais e o que uma pessoa pensa sobre certos assuntos, que diz a Bíblia sobre os absolutos? A Bíblia diz em Salmos 111.4,7,8: “Ele fez memoráveis as suas maravilhas; compassivo e misericordioso é o Senhor. As obras das suas mãos são verdade e justiça; fiéis são todos os seus preceitos. Firmados estão para todo o sempre; são feitos em verdade e retidão”. Alguma vez Deus muda? A Bíblia diz em Malaquias 3:6: “Pois eu, o Senhor, não mudo; por isso vós, ó filhos de Jacó, não sois consumidos”. É a palavra de Deus, a verdade? A Bíblia diz em João 17:17: “Santifica-os na verdade, a tua palavra é a verdade”.

Alguma vez a palavra de Deus mudará? A Bíblia diz em Salmos 93.5: “Mui fiéis são os teus testemunhos; a santidade convém à tua casa, Senhor, para sempre.” A Bíblia diz em Mateus 24.35: “Passará o céu e a terra, mas as minhas palavras jamais passarão”. Quando o Dia do Julgamento chegar, a lei absoluta e imutável de Deus julgará todos. A Bíblia diz em Tiago 2.10-12: “Pois qualquer que guardar toda a lei, mas tropeçar em um só ponto, tem-se tornado culpado de todos. Porque o mesmo que disse: Não adulterarás, também disse: Não matarás. Ora, se não cometes adultério, mas és homicida, te hás tornado transgressor da lei. Falai de tal maneira e de tal maneira procedei, como havendo de ser julgados pela lei da liberdade”. Deus fará todo o ser humano responsável por causa dos absolutos que Ele nos deu na Sua Lei. A Bíblia diz em Romanos 2.6,11: “…que retribuirá a cada um segundo as suas obras; pois para com Deus não há acepção de pessoas”.

A liberdade, em suas mais variadas formas e manifestações, é um dos valores mais altos de uma sociedade que se pretende democrática. No entanto a idéia de que tudo é relativo, de que cada um tem o direito de pensar como quiser, de criar seus próprios códigos, em nome de um permissivismo que podemos alcunhar de pseudoliberdade vem, ao longo dos anos, solapando os alicerces cada vez mais frágeis da sociedade em que vivemos. Com efeito, o relativismo moral vai transformando o mundo numa babel moderna, onde o que vale é o achismo, o assim é se lhe parece, o faça o que lhe der na cabeça, com suas consequências nefastas, seu imensurável e sub-reptício poder destruidor.

Mesmo do ponto de vista da lógica mais simples – longe de mim lucubrações filosoficamente mais profundas – uma coisa não pode ser e não ser ao mesmo tempo, duas verdades não podem se contrapor na sua essência, enfim, tem de existir uma verdade absoluta, incontestável, irretorquível, e essa verdade é Deus. Por mais que respeitemos cientistas, professores, psicólogos, sociólogos e tantos outros profissionais que têm contribuído para o progresso da humanidade, todos eles precisam submeter-se ao absoluto dos absolutos. E isso não é uma idéia melíflua de mentes sentimentalistas e “religiosas”, como muitos, irrefletidamente, se apressam em tachar os que se atrevem a falar em Deus. Para esses críticos, tais pensamentos são muito simplistas, piegas mesmo, não resistem a uma análise mais racional, mais científica.

III. Os Valores Eternos de Deus ao seu Povo

Nada obstante, o que, ou melhor, quem pode botar ordem num mundo cheio de violência, de imoralidade, de perfídia, de corrupção, de insegurança, de desespero? Que cientista mais capaz, que governante mais ilustre, que estadista mais sábio, que sistema ou regime político mais inteligentemente concebido pode pelo menos bacorejar a fórmula para desfazer o caos em que a humanidade se chafurdou? Só mesmo um valor absoluto, um padrão infalível, uma verdade última. Só mesmo os absolutos de Deus, contidos na sua Palavra, perfeita e sublime. Mas aqui vai uma observação: Ele conta com cada um de nós para realizar o seu projeto. Isso é um mistério profundo, como dizia o poeta. Deus preferiu contar comigo e com você para realizar essa obra grandiosa. E isso é também um de seus incompreensíveis absolutos.

É evidente que as únicas coisas de valor eterno neste mundo são as eternas. A vida neste mundo é temporal, não eterna e, portanto, a única parte da vida que tem valor eterno é a que dura pela eternidade. Claramente, o mais importante neste mundo que tem verdadeiro valor eterno é ter uma relação com Jesus Cristo, pois o dom gratuito da vida eterna vem somente por meio dEle a todos aqueles que creem (Jo 3.16). Como Jesus disse: "Eu sou o caminho, e a verdade, e a vida; ninguém vem ao Pai senão por mim" (Jo 14.6). Todo mundo vai viver em algum lugar por toda a eternidade, tanto os cristãos quanto os não-cristãos. E o único destino eterno diferente de estar no céu com Cristo é aquele que proporciona castigos eternos aos que O rejeitam (Mt 25.46).

Em relação às coisas materiais abundantes que este mundo oferece, que muitos buscam tenazmente, Jesus nos ensinou a não armazenar para nós tesouros terrestres que podem ser destruídos ou roubados (Mt 6.19,20). Afinal, não trouxemos nada para este mundo, e não podemos levar nada dele. No entanto, nossos principais valores cristãos muitas vezes são ignorados em nossa busca diligente pelo sucesso e conforto material, e no meio dessas atividades terrenas, muitas vezes nos esquecemos de Deus. Moisés abordou esta questão há 3.500 anos, quando seu povo estava prestes a entrar na Terra Prometida. Ele advertiu-os a não se esquecerem de Deus, pois sabia que "depois de haveres edificado boas casas e morado nelas", seus corações se tornariam orgulhosos e se esqueceriam dEle (Dt 8.12-14). Certamente, não há valor eterno em viver nossas vidas para nós mesmos, procurando tirar da vida tanto quanto possível, assim como o sistema mundial nos faria crer.

Conclusão

O apóstolo Paulo discute a qualidade das obras que podem trazer recompensas eternas. Igualando os cristãos aos "construtores" e a qualidade dos nossos trabalhos com os materiais de construção, Paulo nos informa que os bons materiais que sobrevivem ao fogo do teste divino e têm valor eterno são "ouro, prata e pedras preciosas", ao passo que o uso dos materiais inferiores de "madeira, feno e palha" para construir sobre o fundamento que é Cristo não tem valor eterno e não será recompensado (1 Co 3.11-13). Essencialmente, Paulo está nos dizendo que nem toda a nossa conduta e obras merecerão recompensas.

Há muitas maneiras pelas quais nosso serviço ao Senhor nos trará recompensas. Primeiro, precisamos reconhecer que todo verdadeiro crente foi separado por Deus e para Deus. Quando recebemos o dom de salvação de Deus, recebemos certos dons espirituais (1 Co 12.7, 11). E se pensarmos que nossos dons são insignificantes, precisamos lembrar que, como Paulo disse à igreja em Corinto, o corpo de Cristo é composto de muitas partes (1 Co 12.14). E "Mas Deus dispôs os membros, colocando cada um deles no corpo, como lhe aprouve. … os membros do corpo que parecem ser mais fracos são necessários" (1 Co 12.18, 22). Quando exercitando seus dons espirituais, você está desempenhando um papel importante no corpo de Cristo e fazendo o que tem valor eterno.

Todo membro do corpo de Cristo pode fazer contribuições significativas quando buscamos humildemente edificar o corpo e glorificar a Deus. Na verdade, cada pequena coisa pode adicionar ao lindo mosaico do que Deus pode fazer quando desempenhamos a nossa parte. Lembre-se que, na terra, Cristo não tem outro corpo senão o nosso, nenhuma mão senão as nossas, e nenhum pé senão os nossos. Os dons espirituais são o modo de Deus de administrar a Sua graça aos outros. Quando mostramos o nosso amor por Deus obedecendo aos Seus mandamentos, quando perseveramos na fé, apesar de toda oposição e perseguição, quando em Seu nome mostramos misericórdia aos pobres e doentes e menos afortunados, e quando ajudamos a aliviar a dor e o sofrimento que está ao nosso redor, então estamos construindo com "ouro, prata e pedras preciosas" que têm verdadeiro valor eterno.

Sugestão de Leitura da Semana: ATAÍDE, Romulo. O Cristão e a Pós-Modernidade. São Paulo: Evangelho Avivado, 2017.


sábado, 5 de março de 2022

Comentário Bíblico Mensal: Março/2022 - Capítulo 1 - O que é Ética Cristã

 




Comentarista: Daniel Alcântara



Texto Bíblico Base Semanal: Mateus 15.1-20


1. Então chegaram ao pé de Jesus uns escribas e fariseus de Jerusalém, dizendo:

2. Por que transgridem os teus discípulos a tradição dos anciãos? pois não lavam as mãos quando comem pão.

3. Ele, porém, respondendo, disse-lhes: Por que transgredis vós, também, o mandamento de Deus pela vossa tradição?

4. Porque Deus ordenou, dizendo: Honra a teu pai e a tua mãe; e: Quem maldisser ao pai ou à mãe, certamente morrerá.

5. Mas vós dizeis: Qualquer que disser ao pai ou à mãe: É oferta ao Senhor o que poderias aproveitar de mim; esse não precisa honrar nem a seu pai nem a sua mãe,

6. E assim invalidastes, pela vossa tradição, o mandamento de Deus.

7. Hipócritas, bem profetizou Isaías a vosso respeito, dizendo:

8. Este povo se aproxima de mim com a sua boca e me honra com os seus lábios, mas o seu coração está longe de mim.

9. Mas, em vão me adoram, ensinando doutrinas que são preceitos dos homens.

10. E, chamando a si a multidão, disse-lhes: Ouvi, e entendei:

11. O que contamina o homem não é o que entra na boca, mas o que sai da boca, isso é o que contamina o homem.

12. Então, acercando-se dele os seus discípulos, disseram-lhe: Sabes que os fariseus, ouvindo essas palavras, se escandalizaram?

13. Ele, porém, respondendo, disse: Toda a planta, que meu Pai celestial não plantou, será arrancada.

14. Deixai-os; são cegos condutores de cegos. Ora, se um cego guiar outro cego, ambos cairão na cova.

15. E Pedro, tomando a palavra, disse-lhe: Explica-nos essa parábola.

16. Jesus, porém, disse: Até vós mesmos estais ainda sem entender?

17. Ainda não compreendeis que tudo o que entra pela boca desce para o ventre, e é lançado fora?

18. Mas, o que sai da boca, procede do coração, e isso contamina o homem.

19. Porque do coração procedem os maus pensamentos, mortes, adultérios, fornicação, furtos, falsos testemunhos e blasfêmias.

20. São estas coisas que contaminam o homem; mas comer sem lavar as mãos, isso não contamina o homem.


Momento Interação

Ética cristã é um grupo de princípios morais fundamentado na Palavra de Deus. Esses princípios instruem o homem sobre como ele deve viver sua vida neste mundo de uma forma que agrade ao Senhor. A ética cristã regulamenta o relacionamento do homem com o próximo e com sigo mesmo. Os fundamentos da ética cristã podem ser vistos do começo ao fim das Escrituras. A Bíblia revela explicitamente o padrão moral de Deus. Um exemplo desse padrão pode ser encontrado de forma sintetizada nos 10 mandamentos no Antigo Testamento, e no sermão da montanha no Novo Testamento (Êx 20.2-17; Mt 5-7). Ética é definida como sendo um conjunto de valores morais que estabelecem as diretrizes que regulamentam a vida da humanidade em sociedade. A ética está presente em todas as decisões que o homem toma nas diferentes áreas de sua vida. A palavra “ética” tem origem no termo grego eqikh, que basicamente significa “costume” ou “hábitos”.

Introdução

O significado de Ética cristã aborda o sistema de valores morais estabelecidos e considerados pela Igreja, associados com o Cristianismo histórico e que é utilizado para a sustentação teológica e filosófica dos seus princípios. Ou seja, ética cristã é composta por princípios que possuem como finalidade fazer com que os ensinamentos da Igreja Católica se tornem padrões de ação na sociedade – isso quer dizer que os ensinamentos são padronizados para os relacionamentos e para a própria vida. Sendo assim, a ética cristã opera por meio de diversos pressupostos, instrumentos e conceitos – um dos maiores deles é a Bíblia: os fiéis a utilizam como guia para agir e se comportar como a Igreja Católica estabelece sua ética.

O indivíduo irá buscar viver sua vida levando em consideração os ensinamentos de Jesus, assim como seus mandamentos. As normas de conduta correta estarão sempre presentes neste indivíduo – por terem sido instituídas por Deus. A ética cristã se aplica a obediência à Cristo, não excluindo-se a razão, é claro. A Igreja afirma que a ética cristã é também um mandamento, um ensino, isto é, são diretrizes, ao contrário dos costumes que são flexíveis e variáveis. Portanto, a ética cristã é normativa, pois tem como base as normas estabelecidas pelo Criador.

I. O que é Ética Cristã

Os princípios da ética cristã são extraídos das Escrituras Sagradas. A Bíblia é a infalível e inerrante Palavra de Deus, ou seja, o próprio Deus se revelou nas Escrituras. Por isso ela é totalmente inspira e possui autoridade plena para exortar, corrigir, ensinar e guiar o homem num modo de vida de acordo com a vontade do Senhor. Em primeiro lugar, a ética cristã se fundamenta na realidade da existência de um único Deus. Esse único e verdadeiro Deus subsiste nas pessoas do Pai, do Filho e do Espírito Santo. Ele é santo e imutável, criador de todas as coisas. Ele criou o homem como um ser moralmente responsável, e lhe revelou o padrão moral que o agrada. 

Essa revelação de Deus à humanidade ocorre de diversas formas. Ele se revela através das obras da criação. Tudo o que foi criado por Ele aponta para os seus atributos divinos. O próprio homem foi criado à imagem e semelhança de Deus. Isso significa que apesar do pecado ter deformado essa imagem, em sua consciência o homem ainda carrega os reflexos do padrão moral exigido pelo Criador. Mas é através das Escrituras que Deus se revelou de forma especial à humanidade. Tudo isto torna o homem indesculpável. Ele jamais poderá argumentar que quebrou o padrão ético exigido por Deus devido à ignorância ou desconhecimento.

Em segundo lugar, a ética cristã reconhece que o homem falhou em obedecer a Deus. Ele quebrou sua lei moral, assumindo uma posição de total rebelião contra o Criador. Dessa forma, o homem não se encontra mais num estado moralmente neutro. Sua natureza é caída e inclinada ao mal. Todas as suas decisões naturais são influenciadas pelo pecado. Por isto ele não pode, naturalmente, desejar, amar e cumprir aquilo é espiritualmente bom diante de Deus. Ao contrário, sua ética natural sempre está fundamentada em propósitos egoístas que contrariam a vontade de Deus.

II. A Ética no Antigo Testamento

A atenção de Deus está voltada para o ser humano e suas ações na história. O ser humano, por sua vez, confronta-se com o projeto de Deus, a ser acolhido ou rejeitado. Acolhida ou rejeição, atos da liberdade humana, significam decidir-se, ou não, por um projeto de vida sintonizado com os anseios divinos para a humanidade. Os atos do homem e da mulher de fé são expressões de comunhão ou de discrepância com o que se reconhece serem as orientações do Criador para as suas criaturas. A longa trajetória do povo de Israel, desembocando nas comunidades cristãs, descreve o percurso da humanidade desejosa de adequar seu caminhar (ética) ao querer do Deus de sua fé (teologia).

A vertente ética faz-se presente em todas as grandes tradições literário-teológicas do Antigo Testamento. Ao se referirem ao diálogo entre Deus e a humanidade, comportam as exigências divinas para o ser humano, inserido na história e desafiado a viver, aí, a fidelidade ao Deus do povo. A Tradição Legal (a Torá), por natureza, reporta-se ao projeto de Deus para seu povo formulado com leis apodíticas e casuísticas, mas, também, como narrações que sugerem modos de proceder. A Tradição Profética, ao denunciar os desvios de conduta da liderança e do povo, aponta para o que Deus espera de Israel. A Tradição Histórica narra as consequências da fidelidade e da infidelidade do povo ao seu Deus e comporta um apelo para a vida virtuosa, pressuposto para a bênção divina. 

A Tradição Sapiencial confronta o fiel com a exigência de se decidir por Deus – o caminho da vida –, evitando-se a impiedade e a injustiça – o caminho da morte. A oração de Israel, cujo repertório mais significativo encontra-se nos Salmos, aponta para prática da piedade, feita de comunhão com Deus e com o próximo. Assim, qualquer que seja a porta de entrada para a leitura bíblica veterotestamentária, o fiel se defrontará com indicativos éticos incontornáveis. As muitas imagens de Deus, desde o Deus da Criação, passando pelo Deus da Libertação e, também, do Exílio, para desembocar no Deus na Esperança, todas elas, comportam apelos de conduta para o israelita fiel. Confrontar-se com Deus (teologia) significa escutar-lhe as exigências (ética).

As exigências éticas da Bíblia supõem uma concepção de ser humano, pensado na relação com Deus, donde se desdobrarão as relações com os semelhantes. O trato com o próximo decorre da abertura para o querer divino; o querer divino aponta o modo de proceder adequado no trato com o próximo. Teologia e antropologia, por conseguinte, interpenetram-se, tornando indissociáveis o modo de ser e de proceder do ser humano e o modo de ser e de proceder do Deus libertador.

III. A Ética no Novo Testamento

O único Deus da Criação e Aliança, de Abraão e Israel, de Moisés e Davi, do profeta e sábio, ressuscitou Jesus crucificado de Nazaré dentre os mortos. Essa boa notícia foi celebrada entre seus seguidores como a vindicação de Jesus e sua mensagem, como a revelação do poder e propósito de Deus, e como a garantia do bom futuro de Deus. A ressurreição foi motivo de grande alegria; foi também a base para a ética do Novo Testamento e suas exortações para viver na memória e na esperança, para ver a conduta moral e caráter à luz da história de Jesus, e para discernir uma vida “digna do evangelho de Cristo” (Fp 1.27).

A ressurreição foi a vindicação de Jesus de Nazaré como o Cristo. Ele veio anunciando que “o reino de Deus está próximo” (Mc 1.15), que a futura soberania cósmica de Deus, o bom futuro de Deus, estava próxima. E ele havia feito esse futuro presente; ele já havia feito seu poder em suas palavras de bênção e em suas obras de cura. Ele chamou o povo a se arrepender, para formar sua conduta e caráter em resposta às boas novas daquele futuro vindouro. Ele chamou seus seguidores para “vigiar” por ela e orar por ela, para saudar sua presença e para formar comunidade e caráter de maneiras que antecipassem esse futuro e respondessem às maneiras pelas quais o futuro já estava fazendo com que seu poder fosse sentido nele.

Tal era a forma escatológica da ética de Jesus. Ele anunciou o futuro em axiomas como: “Muitos dos que são os primeiros serão os últimos, e os últimos serão os primeiros” (Mc 10.31; Mt 19.30; Lc 13.30). Ele fez esse futuro presente por sua presença entre os discípulos “como alguém que serve” (Lc 22.27; cf. Mt 20.28; Mc 10.45; Jo 13.2–17). E ele chamou o povo para saudar tal futuro e segui-lo em mandamentos como “Quem quer ser o primeiro deve ser o último de todos e servo de todos” (Mc 9.35; cf. 10.44). Deleitar-se já em um reino vindouro em que os pobres são abençoados devia agora mesmo estar despreocupado com a riqueza (Mt 6.25, 31, 34; Lc 12.22) e dar generosamente para ajudar os pobres (Mc 10.21, Lc 12.33). Receber, mesmo agora, um reino que pertence aos filhos (Mc 10.14) era recebê-los e abençoá-los (Mc 9.37). Responder fielmente a um futuro que foi sinalizado pela conversa aberta de Jesus com as mulheres (por exemplo, Mc 7.24–30; Jo 4.1–26) já tratava as mulheres como iguais. Celebrar o perdão de Deus que fez com que seu poder fosse sentido na comunhão de Jesus com os pecadores (por exemplo, Mc 2.5; Lc 7.48) era receber os pecadores e perdoar os inimigos.

Porque Jesus anunciou e já revelou o vindouro reino de Deus, ele falou “como alguém que tem autoridade” (Mc 1.22), não simplesmente com base na lei ou na tradição ou nas regularidades da experiência. E porque o reino vindouro de Deus exigiu uma resposta de toda a pessoa e não apenas observância externa da lei, Jesus consistentemente fez exigências radicais. Assim, a demanda radical de Jesus pela veracidade substituiu (e cumpriu) a casuística legal sobre juramentos. A exigência radical de perdoar e reconciliar anulou (e cumpriu) limitações legais à vingança. A exigência de amar até os inimigos coloca de lado os debates jurídicos sobre o significado de “vizinho”. Suas instruções morais não se baseavam nos preceitos da lei nem nas regularidades da experiência, mas ele também não as descartava; a lei e a sabedoria foram qualificadas e cumpridas nesta ética de resposta ao futuro reinado do único Deus da Escritura.

Conclusão

É verdade que a Bíblia não é um tipo de lista exaustiva que se refere diretamente e explicitamente a todas as situações de nosso cotidiano. Porém, de modo geral, ela fornece de forma clara e suficiente tudo o que precisamos saber para viver nossa vida diante de Deus e do próximo. Então a ética cristã expõe os padrões absolutos das Escrituras e os aplicam as mais diversas situações de nossas vidas. O padrão ético não-cristão do mundo, seja qual for a alternativa ética adotada, sempre será falho e pecaminoso. Às vezes diante de uma atrocidade alguém pode dizer que faltou a ética. No entanto, isto nunca será verdade.

Todas as decisões que o homem toma se enquadram numa forma ética. Foi dessa forma que até mesmo os eventos mais tenebrosos de nossa História foram justificados por quem os cometeu. Foi assim com o nazismo e os demais casos de genocídio. As grandes guerras também foram fundamentadas em alguma alternativa ética. Atos como a defesa do aborto, eutanásia e ideologias que procuram deturpar a instituição familiar, também seguem princípios de formas éticas não-cristãs, sejam elas humanísticas ou naturalísticas. Essas formas éticas facilmente introduzem seus valores egoístas, individualistas, materialistas e relativistas na sociedade.

Por isto os verdadeiros cristãos rejeitam todas essas alternativas éticas, e enxergam na ética cristã o conjunto dos valores morais exigidos por Deus aos homens, independentemente de sua cultura ou época. Esses valores são imutáveis e absolutos. Mas deve ficar claro que é a ética cristã não é algo que concede ao homem uma forma de salvação ou justificação própria.  A ética cristã é aplicada na vida do cristão como uma forma de gratidão. Ele foi salvo pela graça mediante a fé em Jesus Cristo, e agora deseja viver sua vida com uma conduta que agrada a Deus (Cl 3.1-6).

Sugestão de Leitura da Semana: ROGÉRIO, Marcos. Credo e Conduta. São Paulo: Evangelho Avivado, 2020.