sábado, 21 de março de 2020

A Documentação da Bíblia Sagrada




Por Leonardo Pereira



Há atualmente muitos que têm a impressão de que as Bíblias que temos hoje em dia não são fiéis aos documentos originais. Além do mais, há alguns que ainda pensam que os seus vários livros não foram escritos quando esses próprios livros declaram ter sido escritos. Algumas pessoas pensam que os Evangelhos, por exemplo, não foram relatos de testemunhas oculares como declaram ser, mas são antes narrativas míticas escritas muito mais tarde de modo a estabelecer a doutrina dos cristãos. Perseguindo este tipo de questão, não estamos tentando estabelecer se a Bíblia é inspirada, mas se é autêntica: se o texto é fiel ao original, e se os livros originais foram escritos quando eles declaram ter sido. Neste artigo, olharemos para algumas das evidências que podem nos ajudar a responder a este tipo de questão.

Para se entender a evidência para a Bíblia, é necessário ter-se uns poucos conhecimentos. Primeiro, sabemos que a Bíblia é uma coleção de livros escritos num período de alguns séculos por aproximadamente 40 diferentes autores. Estes livros são divididos em duas seções principais, que chamamos o Velho e o Novo Testamento. Há um período de centenas de anos entre a escrita do último livro do Velho Testamento e o primeiro livro do Novo Testamento. Os estudiosos que se ocupam das questões relacionadas com a autenticidade da Bíblia aplicam a ela exatamente os mesmos testes que aplicam a todos os documentos antigos (ainda que tendam a aplicá-los um pouco mais rigorosamente a um livro que se declara ser inspirado por Deus). Estes testes cobrem uma variedade de assuntos, incluindo tanto evidência interna quanto externa. Evidência interna é a que pode ser determinada olhando-se dentro das páginas dos próprios livros. Evidência externa inclui evidência arqueológica e científica, evidência histórica e cultural, e evidência do manuscrito, que é um documento escrito à mão. Para nossos propósitos correntes, um manuscrito é um documento escrito antes do advento do processo de impressão mecânico (cerca de 1450 d.C.). Por causa das circunstâncias da escrita da Bíblia, o estudo da evidência do manuscrito é geralmente dividida em duas áreas separadas, uma para cada Testamento. No interesse do espaço disponível, examinaremos alguma evidência somente do Novo Testamento.

Primeiro, é interessante notar que os mais antigos manuscritos do Novo Testamento, ainda em existência, datam mais proximamente do tempo da autoria do que é o caso com outros livros antigos. Os mais antigos manuscritos dos escritos de Heródoto, por exemplo, datam aproximadamente de 1300 anos depois de sua morte; e isto não é incomum em livros antigos. Em contraste, há um fragmento do Evangelho de João na Biblioteca da Universidade John Rylands, em Manchester, Inglaterra, que é datado de cerca de 125 d.C. Uma vez que os estudiosos geralmente concordam que João escreveu seu Evangelho numa data mais tardia (entre 60 e 90 d.C.) do que os outros três escritores do Evangelho, este fragmento é especialmente significante. Mais ainda, há um fragmento do Evangelho de Mateus encontrado entre os manuscritos do Mar Morto, datando de antes de 68 d.C. – menos do que 35 anos depois da morte de Jesus! Somando-se a estes, há manuscritos contendo o Evangelho de João, a Epístola aos Hebreus, e a maioria das Epístolas de Paulo, datadas de cerca de 200 d.C. Há manuscritos de todos os quatro evangelhos, bem como outros livros do Novo Testamento, de 200 e tantos d.C. E na sala de manuscritos da Biblioteca Britânica está o manuscrito chamado Sinaiticus, que é datado de 350 d.C., o qual contém o Novo Testamento inteiro. Concluindo, a evidência do manuscrito aponta para a conclusão de que o Novo Testamento foi escrito quando ele declara ter sido escrito: entre cerca de 50 a 100 d.C.

Mas as datas dos vários manuscritos não são o único fator importante. A mera quantidade deles é nada menos do que impressionante. Os mais antigos manuscritos do Novo Testamento foram escritos em papiro, que é relativamente frágil e sujeito a deterioração, nisso não diferindo do papel. Se você viu um recorte de jornal de data tão recente como 1970, percebeu que ele mostra sinais de deterioração depois de apenas 30 anos. Com isto em mente, é uma maravilha que qualquer dos antigos manuscritos em papiro do Novo Testamento tenha sobrevivido a um período de 1500 anos ou mais. De fato, há cerca de 80 de tais manuscritos. E estes são apenas o princípio. No quarto século d.C., o pergaminho substituiu o papiro como o principal meio para cópias da Bíblia. Há próximo de 3000 manuscritos de pergaminho do Novo Testamento Grego, datando do quarto século até o décimo quinto século, quando a imprensa passou a dominar. Em contraste, temos apenas uma cópia manuscrita dos Anais de Tácito, que viveu certa de 55 a 120 d.C., a mesmíssima era dos escritos do Novo Testamento.

Até aqui, em nossa discussão, olhamos somente para os manuscritos do Novo Testamento em Grego, que é a língua na qual foram originalmente escritos. Somando-se aos gregos, há também uma grande quantidade de manuscritos que são versões, traduções para outras línguas. O simples fato que o Novo Testamento foi traduzido é impressionante quando consideramos que era muito incomum traduzir livros no tempo antigo. E o Novo Testamento não foi traduzido somente uma vez, nem foi muito tempo depois da escrita que as traduções começaram a aparecer. A Bíblia foi traduzida independentemente tanto para o Latim como para o Siríaco, algo entre 100 e 150 d.C. Foi traduzida para o Copta (um dialeto egípcio) nos anos 200, para o Armênio e o Georgiano nos anos 400, etc. No todo, há 5000 manuscritos do Novo Testamento ainda em existência. Com tão grande número de manuscritos, foi inevitável que aparecessem variações entre eles. A questão que fica, então, é a extensão e a significância destas variações. Para responder a esta questão, primeiro consideraremos mais alguns fatos a respeito das versões.

Cada uma das traduções, naturalmente, começou uma nova tradição. Por exemplo, quando fizesse cópias da Bíblia em Armênio, o copista geralmente não teria acesso ao manuscrito grego do qual a tradução original foi feita. Assim, ele teria que copiar diretamente da própria tradução armênia. E do mesmo modo, ao fazer mais tarde revisões da tradução: os revisores teriam que ir buscar a armênia existente, junto com quantas edições Gregas eles tinham disponíveis para eles; mas não teriam acesso ao manuscrito do qual a tradução tinha sido feita originalmente. E é assim com cada uma das línguas para as quais a Bíblia foi traduzida. Então, quando olhar para a tabela anexa, tenha em mente que cada uma das linhas verticais representa uma linha separada de transmissão. Ao determinar a exatidão do texto, então, os estudiosos modernos podem comparar cópias do Novo Testamento em um número de diferentes línguas, representando diferentes culturas e diferentes pontos de vista religiosos.

Quando consideramos as grandes diferenças entre as várias culturas representadas pelas traduções antigas, e o grande número das doutrinas variantes existentes nas religiões dessas culturas, esperaríamos haver tremendas diferenças nos textos bíblicos. Mas esse não é o caso. Ao contrário, mesmo com o enorme número de manuscritos e a diversidade das línguas, aproximadamente 85% do texto do Novo Testamento nem mesmo é questionado: em outras palavras, não há discordância entre os manuscritos para esta porção do texto. Quanto aos 15% para os quais existem interpretações variantes entre os manuscritos, a maioria dessas interpretações variantes é facilmente reconhecida como falsa, simplesmente por causa da esmagadora evidência dos manuscritos contra elas. Quanto à pequena porção restante, a maioria das interpretações variantes que não são facilmente descartadas como não autênticas, são tão insignificantes que não mudam substancialmente o significado das passagens nas quais elas ocorrem. De fato, o renomado estudioso da Bíblia F. J. A Hort estima que as variações “substanciais” (aquelas que afetam o significado da passagem) afetam apenas um milésimo do texto. E, ainda nestas poucas instâncias onde o sentido da passagem é afetado ela interpretação variante, o ensino atual da escritura continua incontestado.

Em conclusão, podemos notar que a evidência do manuscrito para o Novo Testamento é verdadeiramente avassaladora. Se abordarmos o assunto objetivamente, temos que admitir que toda a evidência do manuscrito aponta para a veracidade e autenticidade dos livros. Foram escritos quando declaram ter sido escritos, e por quem eles declaram ter sido escritos. E mais ainda, o texto que temos hoje é fiel aos documentos originais. Qualquer declaração, então, de que “a Bíblia foi mudada”, ou que “os Evangelhos foram escritos gerações depois do fato” é demonstrável como falsa. Em conseqüência, qualquer argumento ou doutrina construídos sobre uma tal declaração se desintegra. Sempre que pegamos uma tradução literal da Bíblia, temos em nossas mãos uma versão substancialmente apurada de alguns documentos antigos autênticos e muito importantes.



Obras Citadas: 

1 - International Standard Bible Encyclopedia. G. W. Bromily, redator geral. 1988. Wm. B. Eerdmans Publishing Co. Vol. IV, p. 818.

2 - Kenneth L. Chumbley. The Gospel Argument For God. 1989. Página 26.

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